O que é o
bem, conforme ele se encontra em perfeição na pessoa de Deus?
O caráter e
os atributos perfeitíssimos de Deus são a resposta para tal pergunta.
Destaquemos
por exemplo a sua paciência ou longanimidade, pela qual suporta ofensas e
provocações e todo o mal da parte dos seres morais caídos (demônios e
pecadores) retendo a ira por causa do atributo da justiça, e adiando os seus
juízos para o tempo determinado, sem que tenha qualquer exasperação ou ódio em
sua natureza divina.
Os crentes,
pela natureza divina que neles habita têm tal paciência e longanimidade por
alvo. Desejam e inclinam-se para isto pela natureza celestial que receberam na
conversão. Mas, em razão dos resquícios do pecado original que também neles
habita, e pelo estado de ignorância e incapacidade relativa aos atributos
divinos, que ficaram desfigurados no h0mem, desde a queda, são naturalmente
incapacitados para a realização perfeita deste bem divino ao qual aspiram, e
daí se dizer que quando querem fazer o bem, não o fazem, pois não podem
atendê-lo na plenitude em que se encontra no próprio Deus.
Pelo mesmo
raciocínio, isto pode ser aplicado ao amor, à bondade, à paz, à fé, ao domínio
próprio, à misericórdia, e a tudo o mais que se encontra em perfeição em Deus, e
que foi perdido pelo homem em razão do pecado original.
Daí Jesus dizer
que tudo o que procede do coração do homem é somente o mal, pois está incapacitado
por sua natureza terrena decaída, a fazer o bem conforme ele é definido na
pessoa do próprio Deus. E os crentes são incentivados a serem imitadores de
Deus, levando à cruz o velho homem, para que atuem pela nova inclinação que
neles está, pelo Espírito, exercitando-se em amar seus inimigos, em oferecerem
a outra face quando feridos em uma delas, a caminharem a segunda milha, a
orarem pelos seus perseguidores, a abençoarem os que os amaldiçoam, pois nisto é
que se manifesta o quanto têm aprendido e praticado a genuína misericórdia,
amor, longanimidade etc, conforme se encontram em Deus.
Os próprios
atos de benignidade pensados e atuados pelos homens, em razão dos resquícios da
obra da lei escrita em seus corações, conforme o homem foi dotado pelo Senhor
na criação (Rom 2.15), são manchados pelo pecado, pois esta inscrição da criação
original foi corrompida pelo pecado, de modo que o h0mem não somente não
entende de modo perfeito o que é o bem, como também não pode realiza-lo de
forma perfeita, pelos motivos e inclinações corretos, em harmonia com todos os
demais atributos que compõem o caráter e a sua personalidade, os quais, a propósito,
também não são perfeitos.
A razão
disso é explicada pelo apóstolo, ao dizer que mesmo querendo fazer o bem, o mal
está presente com ele (Rom 7.21).
Há assim,
mesmo nos crentes, essa imperfeição na realização do bem, por conta da natureza
imperfeita que neles habita ao lado da perfeita (nova natureza) que receberam
na conversão.
Todo o
conhecimento deles é em parte, mesmo o relativo ao bem, e aos atributos de
Deus. E não podem avançar neste conhecimento sem que estejam em plena comunhão
com Deus, pois aprende-se por osmose, recebendo da fonte, assim como os ramos
recebem a seiva estando ligados ao caule da videira.
Eis a razão
de serem instados à oração e à vigilância permanentes e constantes, para
poderem avançar em direção àquela perfeição celestial e espiritual à qual são
movidos pela nova natureza divina que neles habita, e pela qual aspiram,
segundo o mover do Espírito Santo. Ainda que esta não seja alcançada em sua
perfeição gloriosa enquanto aqui viverem, todavia é possível aumentar em graus
cada vez maiores por meio da diligência em santificação.
O trabalho
da santificação deve permanecer durante toda a jornada terrena, pois se não houver
avanços, os recuos serão inevitáveis, pois ainda que a raiz do pecado seja enfraquecida
pelas maiores infusões da graça, ela nunca morre definitivamente enquanto
estivermos aqui deste outro lado do céu, e o trabalho de mortificação deve ser
contínuo, porque ainda que fraco, o pecado mantém o seu poder mortal e
destruidor.
A lei do Espírito
da vida, em Cristo Jesus, livrou o crente da lei do pecado e da morte (Rom 8.2).
Mas esta libertação se mostra eficaz aqui embaixo somente quando o crente se
santifica. A libertação será completa e final, somente a partir da ida do
crente para o céu, quando deixar o corpo desta morte. Até lá, há de servir à
lei de Deus com a sua mente e vontade, mas com a carne à lei do pecado (Rom
7.25), porque a lei do pecado há de estar nos seus membros até o dia da sua
morte, ao lado da lei do Espírito que habita também nele operando em sua mente,
e opondo-se à lei do pecado.
Mas, ao se dizer que servirá à lei do pecado
com a carne, isto não significa que deve se render à ação desta lei, deste
princípio vivo e mortal que opera nos seus membros, mas que deve vigiar contra
isto e mortificar o pecado, para que em vez de ser dominado por esta lei, seja
dirigido pela nova lei do Espírito que inclina a sua mente para aquilo que é
aprovado por Deus e agradável a Ele.
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