John Owen (1616-1683)
Traduzido,
Adaptado e Editado por Silvio Dutra
INTRODUÇÃO
PELO TRADUTOR:
O que é o bem, conforme ele se encontra em perfeição na pessoa de Deus?
O caráter e
os atributos perfeitíssimos de Deus são a resposta para tal pergunta.
Destaquemos
por exemplo a sua paciência ou longanimidade, pela qual suporta ofensas e
provocações e todo o mal da parte dos seres morais caídos (demônios e
pecadores) retendo a ira por causa do atributo da justiça, e adiando os seus
juízos para o tempo determinado, sem que tenha qualquer exasperação ou ódio em
sua natureza divina.
Os crentes,
pela natureza divina que neles habita têm tal paciência e longanimidade por
alvo. Desejam e inclinam-se para isto pela natureza celestial que receberam na
conversão. Mas, em razão dos resquícios do pecado original que também neles
habita, e pelo estado de ignorância e incapacidade relativa aos atributos
divinos, que ficaram desfigurados no homem, desde a queda, são naturalmente
incapacitados para a realização perfeita deste bem divino ao qual aspiram, e
daí se dizer que quando querem fazer o bem, não o fazem, pois não podem
atendê-lo na plenitude em que se encontra no próprio Deus.
Pelo mesmo
raciocínio, isto pode ser aplicado ao amor, à bondade, à paz, à fé, ao domínio
próprio, à misericórdia, e a tudo o mais que se encontra em perfeição em Deus,
e que foi perdido pelo homem em razão do pecado original.
Daí Jesus
dizer que tudo o que procede do coração do homem é somente o mal, pois está
incapacitado por sua natureza terrena decaída, a fazer o bem conforme ele é
definido na pessoa do próprio Deus. E os crentes são incentivados a serem
imitadores de Deus, levando à cruz o velho homem, para que atuem pela nova
inclinação que neles está, pelo Espírito, exercitando-se em amar seus inimigos,
em oferecerem a outra face quando feridos em uma delas, a caminharem a segunda
milha, a orarem pelos seus perseguidores, a abençoarem os que os amaldiçoam,
pois nisto é que se manifesta o quanto têm aprendido e praticado a genuína
misericórdia, amor, longanimidade etc, conforme se encontram em Deus.
Os próprios
atos de benignidade pensados e atuados pelos homens, em razão dos resquícios da
obra da lei escrita em seus corações, conforme o homem foi dotado pelo Senhor
na criação (Rom 2.15), são manchados pelo pecado, pois esta inscrição da
criação original foi corrompida pelo pecado, de modo que o h0mem não somente
não entende de modo perfeito o que é o bem, como também não pode realiza-lo de
forma perfeita, pelos motivos e inclinações corretos, em harmonia com todos os
demais atributos que compõem o caráter e a sua personalidade, os quais, a
propósito, também não são perfeitos.
A razão
disso é explicada pelo apóstolo, ao dizer que mesmo querendo fazer o bem, o mal
está presente com ele (Rom 7.21).
Há assim,
mesmo nos crentes, essa imperfeição na realização do bem, por conta da natureza
imperfeita que neles habita ao lado da perfeita (nova natureza) que receberam
na conversão.
Todo o
conhecimento deles é em parte, mesmo o relativo ao bem, e aos atributos de
Deus. E não podem avançar neste conhecimento sem que estejam em plena comunhão
com Deus, pois aprende-se por osmose, recebendo da fonte, assim como os ramos
recebem a seiva estando ligados ao caule da videira.
Eis a razão
de serem instados à oração e à vigilância permanentes e constantes, para
poderem avançar em direção àquela perfeição celestial e espiritual à qual são
movidos pela nova natureza divina que neles habita, e pela qual aspiram,
segundo o mover do Espírito Santo. Ainda que esta não seja alcançada em sua
perfeição gloriosa enquanto aqui viverem, todavia é possível aumentar em graus
cada vez maiores por meio da diligência em santificação.
O trabalho
da santificação deve permanecer durante toda a jornada terrena, pois se não
houver avanços, os recuos serão inevitáveis, pois ainda que a raiz do pecado
seja enfraquecida pelas maiores infusões da graça, ela nunca morre
definitivamente enquanto estivermos aqui deste outro lado do céu, e o trabalho
de mortificação deve ser contínuo, porque ainda que fraco, o pecado mantém o
seu poder mortal e destruidor.
A lei do
Espírito da vida, em Cristo Jesus, livrou o crente da lei do pecado e da morte
(Rom 8.2). Mas esta libertação se mostra eficaz aqui embaixo somente quando o
crente se santifica. A libertação será completa e final, somente a partir da
ida do crente para o céu, quando deixar o corpo desta morte. Até lá, há de
servir à lei de Deus com a sua mente e vontade, mas com a carne à lei do pecado
(Rom 7.25), porque a lei do pecado há de estar nos seus membros até o dia da
sua morte, ao lado da lei do Espírito que habita também nele operando em sua
mente, e opondo-se à lei do pecado.
Mas, ao se dizer que servirá à lei do pecado
com a carne, isto não significa que deve se render à ação desta lei, deste
princípio vivo e mortal que opera nos seus membros, mas que deve vigiar contra
isto e mortificar o pecado, para que em vez de ser dominado por esta lei, seja
dirigido pela nova lei do Espírito que inclina a sua mente para aquilo que é
aprovado por Deus e agradável a Ele.
PREFÁCIO
Que a doutrina do pecado original é uma das verdades fundamentais da
nossa profissão cristã sempre foi admitido na igreja de Deus; e toda parte
especial é dessa possessão peculiar da verdade que apreciam aqueles, cuja
religião para com Deus é construída e resolvida em revelação divina. Como o
mundo, por sua sabedoria, nunca conheceu a Deus corretamente, então os sábios do
mundo sempre ignoraram completamente esse mal da raça em si e em outros. Mas
para nós a doutrina e a convicção dela estão no próprio fundamento de tudo com
o que temos que lidar com Deus, em referência ao nosso agrado dele aqui, ou para
obter o gozo dele mais adiante, também é conhecida a influência que ela tem nas
grandes verdades sobre a pessoa de Cristo, sua mediação, os frutos e os efeitos
dela, com todos os benefícios dos quais somos feitos participantes. Sem uma
suposição disso, nenhum deles pode ser verdadeiramente conhecido ou crido. Esse
assunto tem sido amplamente tratado por muitos homens santos e sábios, tanto
dos tempos antigos quanto dos últimos dias. Alguns têm trabalhado na descoberta
de sua natureza, de sua culpa e demérito; por quem também a verdade sobre isso
foi reivindicada pela oposição feita nas eras passadas e presentes. Porque a
maioria dessas coisas foi considerada em toda a extensão e latitude, com
respeito a todos os homens por natureza, com a propriedade e condição de todos
que estão totalmente sob o poder e a culpa do pecado original. Como, os homens
são assim incapacitados em si mesmos para responder à obediência exigida na lei
ou no evangelho, de modo a libertar-se da maldição de um ou se tornar
participantes da bênção do outro, tem sido por muitos também plenamente
evidenciado. Além disso, como há resquícios de pecado que permanecem nos
crentes após a sua regeneração e conversão a Deus, como a Escritura testifica
abundantemente, então foi completamente ensinado e confirmado; como também que
a culpa é perdoada a eles, e por que meios o poder dele está enfraquecido
neles. Todas essas coisas, digo, foram amplamente tratadas, para o grande
benefício e edificação da igreja. No que temos agora em desígnio, consideramos
todos estes resquícios e esforçamo-nos mais para continuar a descobri-los em
suas atuações e oposições à lei e à graça de Deus nos crentes. Também não
pretendo discutir qualquer coisa que tenha sido controvertida sobre isso. O que
as Escrituras claramente revelam e ensinam sobre isso, o que os crentes
evidentemente acham pela experiência em si mesmos, o que eles podem aprender
com os exemplos dos outros, deve ser representado de forma adequada à
capacidade do mais fraco que esteja preocupado com isso. E muitas coisas
parecem tornar o seu tratamento nesse tempo não desnecessário. Os efeitos e os
frutos disso, que vemos nas apostasias e nas costas de muitos pecados
escandalosos e os erros de alguns, e o curso e a vida, mais parecem exigir uma
consideração devida. Além disso, de quão grande interesse um conhecimento
completo e claro do poder deste pecado interior (o assunto destinado a ser
aberto) deve levar os crentes, à
vigilância e diligência, fé e oração, para chamá-los ao arrependimento,
humildade e autoabatimento, aparecerão em nosso progresso. Esses, em geral,
foram os fins visados no discurso que se segue, que, sendo primeiro composto e entregue para o
uso e benefício de alguns, é agora pela providência de Deus tornado público. E se o leitor receber
alguma vantagem por esses fracos esforços, que ele saiba que é seu dever, dar
glória a Deus, para ajudar por suas orações aqueles que, em muitas tentações e
aflições, estão dispostos a trabalhar na vinha do Senhor, o trabalho a que são
chamados.
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