Nós vemos neste 23º
capítulo de I Samuel, que estaremos comentando, que Davi demonstrou o seu
sincero desejo de expor a sua vida para o bem-estar do Seu povo, revelando o
seu espírito público e heróico, quando mesmo em meio às perseguições de Saul,
se dispôs a livrar a cidade israelita de Queila de um ataque dos filisteus.
Ele havia consultado o
Senhor para saber se deveria combater os filisteus em Queila, e Ele lhe disse que deveria fazê-lo ferindo os
filisteus e salvando aquela cidade.
Mas seus homens
protestaram com ele a respeito da condição em que se encontravam, pois temiam
sofrer uma investida de Saul numa exposição como aquela.
Davi consultou o Senhor
mais uma vez, certamente não porque duvidasse da primeira resposta dEle, porque
Davi era um homem de fé, mas para dar aos seus homens a convicção que de fato o
Senhor havia feito tal determinação.
E a resposta que foi dada
nesta segunda consulta garantia que os filisteus seriam entregues nas mãos
deles. E com isto se dispuseram à peleja.
Há uma citação no sexto versículo que quando o
sacerdote Abiatar viera a ter com Davi na cidade de Queila, ele o fizera com
uma estola sacerdotal na mão.
Esta citação parece estar
deslocada no que é dito antes e depois, mas ela foi aqui inserida para indicar
que foi provavelmente por meio de Abiatar, que Deus fora consultado, conforme o
confirma os versos 9 e 10, pois depois de ter livrado a Queila, e quando soube
que Saul estava se dirigindo para lá com suas tropas, para matar a Davi e seus
homens, que nesta ocasião haviam subido a seiscentos, ele mandou Abiatar trazer
a estola e consultar a Deus, para saber se Saul desceria efetivamente a Queila,
e se os cidadãos daquela cidade o entregariam nas mãos de Saul. E o Senhor
respondeu afirmativamente a ambas perguntas.
Nem sempre se pode contar
com a gratidão dos homens, quando os interesses deles estão correndo algum
risco.
Tal se dera com os
gadarenos que expulsaram Jesus do território deles, por causa do prejuízo que poderiam
continuar sofrendo em suas propriedades pela ação dos demônios que ele estava
expulsando.
Para manterem o seu
conforto e segurança mundanos eles preferiram ficar sem a bênção de Deus.
O mesmo estava
acontecendo com Davi, em relação aos habitantes de Queila.
Apesar de terem sido
livrados por ele do ataque dos filisteus, temiam uma possível represália de
Saul contra eles, caso não entregassem Davi em suas mãos, e com isto estariam
imitando os homens de Judá, nos dias de Sansão, que o amarraram para entregá-lo
aos filisteus, por temerem uma represália deles caso acobertassem Sansão, que
vinha agindo como um grande inimigo dos filisteus.
Isto é uma coisa
deplorável, mas muito comum de ser vista entre os homens.
Foi por esta mesma razão
que Jesus foi entregue pelo seu próprio povo, os judeus, aos romanos, para ser
crucificado.
Ele somente lhes fizera
bem durante todo o seu ministério terreno, e pagaram o bem que receberam com o
mal, por temerem uma represália dos romanos contra eles.
A causa da justiça sempre
sofrerá quando os homens buscarem o próprio interesse deles.
Apesar da triste
realidade que se vê no mundo político, porque os homens sempre se ligarão em
sua grande maioria àqueles que detêm o poder em suas mãos, ainda que a causa da
justiça e da verdade possam sofrer os maiores danos, este livramento produzido
por Davi em Queila confirmaria o seu espírito público e heróico, e o seu total
desinteresse em colocar a sua vida em risco pela causa de Deus e do Seu povo.
Isto contribuiria grandemente
para que viesse a ser reconhecido pelo
povo como aquele que deveria realmente reinar sobre eles.
Ele era o escolhido do
Senhor, mas se faria também necessário contar com a aprovação dos israelitas, e
foi por isso que Deus ordenou que Ele libertasse os cidadãos de Queila,
independentemente de saber que eles o entregariam assim mesmo nas mãos de Saul.
A propósito, inclusive
Saul foi reconhecido como rei em Israel, quando se dispôs a libertar os
cidadãos de Gileade, do ataque que seria despejado sobre eles pelos amonitas.
Aquela dificuldade havia
contribuído para o reconhecimento dele como rei, e as dificuldades que Davi
estava vencendo também contribuiriam para o mesmo propósito.
Foi por isso que o
profeta Gade falou a Davi que ele deveria retornar das terras de Moabe para
Judá, pois Deus começaria a produzir as condições que o conduziriam ao trono, e
uma delas foi esta ação dele para libertar os habitantes de Queila.
Então as ingratidões do
homens, não podem interferir nos projetos de Deus em relação às nossas
vidas.
O sacerdote Abiatar é
visto neste capítulo servindo fielmente a Davi, e ele foi estabelecido como
sacerdote até o início do reinado de Salomão, quando foi substituído por
Zadoque, por ter sido acusado de traição.
Com isto se deu cumprimento
cabal à palavra de Deus em relação à casa de Eli, porque sendo o que restara da
sua descendência, veio por fim a ser afastado do sacerdócio, conforme Deus
havido sentenciado em relação à casa de Eli, de que removeria o sacerdócio
dela.
De Queila, Davi partiu
sem um rumo definido (v. 13), e veio dar na região montanhosa do deserto de
Zife, e ainda que Saul o buscasse todos os dias, Deus não o entregou nas suas
mãos (v. 14).
E quando Davi se
encontrava numa região do deserto de Zife, chamada Horesa, Jônatas veio ao seu
encontro para fazer uma aliança com ele perante o Senhor, pois Jônatas viera
com o propósito de fortalecer a confiança de Davi em Deus (v. 16), e lhe disse
da sua convicção de que não deveria temer a mão de seu pai, Saul, porque sabia
que Davi viria a reinar sobre Israel, e que ele havia renunciado à coroa em
favor de Davi diante de seu próprio pai.
E Jônatas esperava ser o
segundo homem em importância no reino, e não sabia que o Senhor tinha outros
planos para ele, pois viria também a morrer numa batalha contra os filisteus,
juntamente com seu pai, de modo que Davi não ficaria vinculado à casa de Saul,
quando assumisse o reino, e isto certamente seria feito não porque Jônatas não
reunisse qualidades morais e espirituais para estar ao seu lado, mas pela
confusão política e a dificuldade que seria a de o povo aceitar que Jônatas,
que seria o sucessor legal ao trono, ficar sob as ordens de Davi.
Então o próprio Deus
estava se encarregando de acomodar as coisas de tal forma, que não houvesse
divisões sérias e profundas que se prolongariam durante todo o reinado de Davi.
Nós veremos que a par de
todas estas providências, não foi com pouca resistência, que Davi assumiu o
reino de Israel, tanto que teve que
reinar em princípio, somente sobre Judá, em Hebrom, por sete anos, até que
fosse reconhecido por todo o povo de Israel como rei de toda a nação.
Movidos pelo mesmo sentimento dos cidadãos de
Queila, os habitantes do deserto de Zife, os zifeus, também denunciaram a
presença de Davi entre eles a Saul, mas quando este empreendeu perseguição a
Davi e aos seus seiscentos homens, estes já haviam se deslocado para o deserto
de Maom, e ainda embriagado com o sangue dos sacerdotes de Nobe e com uma sede
ainda maior de sangue, Saul insistiu na perseguição, e foi também para o
deserto de Maom, e enquanto ele e seus homens percorriam um lado do monte em
que Davi se encontrava, este com seus homens se deslocavam no lado oposto do
monte, de modo que um encontro entre eles seria inevitável, e mais uma vez nós
vemos a providência de Deus operando, pois certamente o Senhor incitara os
filisteus a atacarem Israel, e isto fez com que Saul tivesse que suspender e
adiar a perseguição a Davi, motivo porque aquele lugar foi chamado de
Selá-Hamalecote, que é uma palavra hebraica composta que significa Pedra de
Escape (v. 28).
Tendo recebido tal
livramento da parte do Senhor, Davi não
tentou a Deus permanecendo ali, e se dirigiu para uma região mais segura
chamada En-Gedi (v. 29).
Enquanto estava sendo
duramente espiado pelos zifeus para ser denunciado a Saul em todo aquele grande
deserto de Judá, ele escreveu as palavras do Salmo 63, no qual vemos que a sua
confiança permanecia inabalável em Deus, enquanto homens perversos e
interesseiros se levantavam contra ele.
Ele afirma a sua inteira
confiança na justiça de Deus para recompensar o justo e castigar os perversos.
“1 Ora, foi anunciado a
Davi: Eis que os filisteus pelejam contra Queila e saqueiam as eiras.
2 Pelo que consultou Davi
ao Senhor, dizendo: Irei eu, e ferirei a esses filisteus? Respondeu o Senhor a
Davi: Vai, fere aos filisteus e salva a Queila.
3 Mas os homens de Davi
lhe disseram: Eis que tememos aqui em Judá, quanto mais se formos a Queila,
contra o exército dos filisteus!
4 Davi, pois, tornou a
consultar ao Senhor, e o Senhor lhe respondeu: Levanta-te, desce a Queila,
porque eu hei de entregar os filisteus na tua mão.
5 Então Davi partiu com
os seus homens para Queila, pelejou contra os filisteus, levou-lhes o gado, e
fez grande matança entre eles; assim Davi salvou os moradores de Queila.
6 Ora, quando Abiatar,
filho de Aimeleque, fugiu para Davi, a Queila, desceu com uma estola sacerdotal
na mão.
7 Então foi anunciado a
Saul que Davi tinha ido a Queila; e disse Saul: Deus o entregou nas minhas mãos;
pois está encerrado, porque entrou numa cidade que tem portas e ferrolhos.
8 E convocou todo o povo
à peleja, para descerem a Queila, e cercar a Davi e os seus homens.
9 Sabendo, pois, Davi que
Saul maquinava este mal contra ele, disse a Abiatar, sacerdote: Traze aqui a
estola sacerdotal.
10 E disse Davi: Ó
Senhor, Deus de Israel, teu servo acaba de ouvir que Saul procura vir a Queila,
para destruir a cidade por causa de mim.
11 Entregar-me-ão os
cidadãos de Queila na mão dele? descerá Saul, como o teu servo tem ouvido? Ah,
Senhor Deus de Israel! faze-o saber ao teu servo. Respondeu o Senhor: Descerá.
12 Disse mais Davi:
Entregar-me-ão os cidadãos de Queila, a mim e aos meus homens, nas mãos de
Saul? E respondeu o Senhor: Entregarão.
13 Levantou-se, então,
Davi com os seus homens, cerca de seiscentos, e saíram de Queila, e foram-se
aonde puderam. Saul, quando lhe foi anunciado que Davi escapara de Queila,
deixou de sair contra ele.
14 E Davi ficou no
deserto, em lugares fortes, permanecendo na região montanhosa no deserto de
Zife. Saul o buscava todos os dias, porém Deus não o entregou na sua mão.
15 Vendo, pois, Davi que
Saul saíra à busca da sua vida, esteve no deserto de Zife, em Hores.
16 Então se levantou
Jônatas, filho de Saul, e foi ter com Davi em Hores, e o confortou em Deus;
17 e disse-lhe: Não
temas; porque não te achará a mão de Saul, meu pai; porém tu reinarás sobre
Israel, e eu serei contigo o segundo; o que também Saul, meu pai, bem sabe.
18 E ambos fizeram
aliança perante o Senhor; Davi ficou em Hores, e Jônatas, voltou para sua casa.
19 Então subiram os
zifeus a Saul, a Gibeá, dizendo: Não se escondeu Davi entre nós, nos lugares
fortes em Hores, no outeiro de Haquilá, que está à mão direita de Jesimom?
20 Agora, pois, ó rei,
desce apressadamente, conforme todo o desejo da tua alma; a nós nos cumpre
entregá-lo nas mãos do rei.
21 Então disse Saul:
Benditos sejais vós do Senhor, porque vos compadecestes de mim:
22 Ide, pois,
informai-vos ainda melhor; sabei e notai o lugar que ele frequenta, e quem o
tenha visto ali; porque me foi dito que é muito astuto.
23 Pelo que atentai bem,
e informai-vos acerca de todos os esconderijos em que ele se oculta; e então
voltai para mim com notícias exatas, e eu irei convosco. E há de ser que, se
estiver naquela terra, eu o buscarei entre todos os milhares de Judá.
24 Eles, pois, se
levantaram e foram a Zife adiante de Saul; Davi, porém, e os seus homens
estavam no deserto de Maom, na campina ao sul de Jesimom.
25 E Saul e os seus
homens foram em busca dele. Sendo isso anunciado a Davi, desceu ele à penha que
está no deserto de Maom. Ouvindo-o Saul, foi ao deserto de Maom, a perseguir
Davi.
26 Saul ia de uma banda
do monte, e Davi e os seus homens da outra banda. E Davi se apressava para
escapar, por medo de Saul, porquanto Saul e os seus homens iam cercando a Davi
e aos seus homens, para os prender.
27 Nisso veio um
mensageiro a Saul, dizendo: Apressa-te, e vem, porque os filisteus acabam de
invadir a terra.
28 Pelo que Saul voltou
de perseguir a Davi, e se foi ao encontro dos filisteus. Por esta razão aquele
lugar se chamou Selá-Hamalecote.
29 Depois disto, Davi
subiu e ficou nos lugares fortes de En-Gedi.” (I Sm 23.1-29)
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