Depois de ter se
despedido de Jônatas, Davi foi para Nobe, uma das cidades dos sacerdotes, que
eram treze ao todo (Js 21.19).
Neste capítulo 21º de I
Samuel, que estaremos comentando, nós vemos que Davi, apesar de todas as
qualidades de que estava dotado o seu espírito, era também um homem sujeito às
fraquezas, e nós o vemos mentindo ao sacerdote Aimeleque em Nobe, dizendo que
estava em missão secreta, a mando de Saul, e provavelmente ele fizera isto
porque se achava ali naquele lugar um edomita chamado Doegue, que era o maioral
dos pastores de Saul (v. 7).
Estando Davi faminto e
também os homens que o acompanhavam, pediu comida ao sacerdote e este lhe deu
os cinco pães, que haviam sido consagrados ao Senhor, os pães da proposição que
eram colocados na mesa dos pães do tabernáculo, sob a condição de que ele e
seus homens não estivessem imundos cerimonialmente, por haver ainda neles
alguma polução de um possível contato com mulheres, e Davi lhe disse que era
costume dele e de seus homens não tocarem em mulher quando saíam em campanha
(v. 3-6)
É bem provável que nesta
ocasião, toda a estrutura do tabernáculo havia sido transferida de Siló para
Nobe, sem a arca, que continuava em Quiriate-Jearim, e isto em razão de Siló
ter sido abandonada pelo Senhor.
É também provável que
Samuel tenha recebido ordem direta do Senhor para proceder a tal transferência
para indicar de modo visível que havia de fato rejeitado a Siló.
Davi estava recebendo o
seu espinho na carne tal como o apóstolo Paulo recebera o dele, para o mesmo
fim de não se ensoberbecer diante das grandes maravilhas que o Senhor estava
fazendo e que ainda faria através dele.
Ele é deixado à mercê das
circunstâncias difíceis que o rodeavam, e ele se sente transtornado a ponto de
buscar refúgio entre os próprios inimigos de Israel, uma vez que estava sendo
declarado por Saul como sendo um traidor do seu povo, por ter deserdado de suas
obrigações, como um dos chefes do exército de Israel.
Davi não havia desertado,
mas certamente Saul estava espalhando esta falsa notícia enquanto ocultava a
verdadeira causa da fuga de Davi, que era a sua determinação de que o mataria
injusta e covardemente.
Por certo, as
perseguições que empreenderia contra Davi deveriam ser justificadas por ele
perante o povo como a busca de um desertor e traidor (22.8).
Davi não pôde sequer
levar qualquer arma consigo e por isso retomou a espada de Golias, que se
encontrava com os sacerdotes em Nobe, e partiu para Gate, exatamente a cidade
dos filisteus à qual pertencia Golias, e ele vai ter com o rei filisteu chamado
Aquis, e como os servos do rei desconfiavam de que ele era o Davi do qual se
dizia ter ferido os seus dez milhares, e Saul os seus milhares, ele teve muito
medo de ser descoberto no meio dos inimigos de Israel, e passou a se fingir de
louco, e saiu-se tão bem em sua representação teatral que convenceu ao próprio
Áquis que tinha de fato problemas mentais (v. 10-15).
E tendo conseguido
escapar de ser identificado pelos filisteus, Davi retirou-se dali e foi buscar
refúgio na caverna de Adulão, como veremos no capitulo seguinte.
Para podermos conhecer
algo mais do estado de espírito em que Davi se encontrava, quando na caverna de
Adulão, e como ele buscou auxílio em Deus naquela ocasião, devemos ler o Salmo
142, que ele compôs quando estava na
citada caverna.
Nós vemos através da
exposição deste Salmo que não havia nenhuma contradição entre o fato de Davi
ter sido ungido a mando de Deus para ser rei de Israel e toda a situação que
Deus estava permitindo que lhe sobreviesse, pois até mesmo em suas dificuldades
e tribulações o Senhor estava cumprindo todos os Seus propósitos em relação à
vida de Davi, de modo que ele viesse a ser um rei justo e compassivo, que se
apiedasse dos fracos e perseguidos, por causa das experiências que ele estava
vivendo.
Além disso ele estava
aprendendo o quão duro é ser perseguido, de maneira que quando estivesse no
trono, não viria a perseguir injustamente a qualquer pessoa, pois estava
aprendendo em sua própria experiência pessoal, quão pecaminosa é tal atitude
aos olhos de Deus, e quão afastada ela está de um espírito verdadeiramente reto
e justo.
Devemos dizer numa
palavra final para sermos justos com Davi, que a par de toda o transtorno que
havia sentido em razão de suas tribulações, nós vemos que continuava no pleno
exercício de suas faculdades, e nada havia mudado em seu espírito quando mudou
o seu comportamento e se fingiu de louco na presença de Aquis, rei de Gate,
como bem podemos observar no Salmo 34 que ele compôs naquela ocasião,
Além disso, as duras
experiências de Davi para que fosse aperfeiçoado em seu aprendizado para o
exercício de uma sábia liderança, não terminariam aqui com as perseguições de
Saul.
Ele aprenderia também a
dura lição de ter que suportar a ingratidão dos homens, especialmente no caso
dos cidadãos de Queila e dos zifeus, como veremos adiante, e ele demonstrou em
outros Salmos que compôs nestas ocasiões, que havia de fato aprendido que não
se deve confiar na instabilidade da natureza terrena, mas somente no Senhor,
porque somente Ele é inteiramente fiel, santo e justo.
“1 Então veio Davi a
Nobe, ao sacerdote Aimeleque, o qual saiu, tremendo, ao seu encontro, e lhe
perguntou: Por que vens só, e ninguém contigo?
2 Respondeu Davi ao
sacerdote Aimeleque: O rei me encomendou um negócio, e me disse: Ninguém saiba
deste negócio pelo qual eu te enviei, e o qual te ordenei. Quanto aos mancebos,
apontei-lhes tal e tal lugar.
3 Agora, pois, que tens à
mão? Dá-me cinco pães, ou o que se achar.
4 Ao que, respondendo o
sacerdote a Davi, disse: Não tenho pão comum à mão; há, porém, pão sagrado, se
ao menos os mancebos se têm abstido das mulheres.
5 E respondeu Davi ao
sacerdote, e lhe disse: Sim, em boa fé, as mulheres se nos vedaram há três
dias; quando eu saí, os vasos dos mancebos também eram santos, embora fosse
para uma viagem comum; quanto mais ainda hoje não serão santos os seus vasos?
6 Então o sacerdote lhe
deu o pão sagrado; porquanto não havia ali outro pão senão os pães da
proposição, que se haviam tirado de diante do Senhor no dia em que se tiravam
para se pôr ali pão quente.
7 Ora, achava-se ali
naquele dia um dos servos de Saul, detido perante o Senhor; e era seu nome
Doegue, edomita, chefe dos pastores de Saul.
8 E disse Davi a
Aimeleque: Não tens aqui à mão uma lança ou uma espada? porque eu não trouxe
comigo nem a minha espada nem as minhas armas, pois o negócio do rei era
urgente.
9 Respondeu o sacerdote:
A espada de Golias, o filisteu, a quem tu feriste no vale de Elá, está aqui
envolta num pano, detrás da estola sacerdotal; se a queres tomar, toma-a,
porque não há outra aqui senão ela. E disse Davi: Não há outra igual a essa;
dá-ma.
10 Levantou-se, pois,
Davi e fugiu naquele dia de diante de Saul, e foi ter com Áquis, rei de Gate.
11 Mas os servos de Áquis
lhe perguntaram: Este não é Davi, o rei da terra? não foi deste que cantavam
nas danças, dizendo: Saul matou os seus milhares, mas Davi os seus dez
milhares?
12 E Davi considerou
estas palavras no seu coração, e teve muito medo de Áquis, rei de Gate.
13 Pelo que se contrafez
diante dos olhos deles, e fingiu-se doido nas mãos deles, garatujando nas
portas, e deixando correr a saliva pela barba.
14 Então disse Áquis aos
seus servos: Bem vedes que este homem está louco; por que mo trouxestes a mim?
15 Faltam-me a mim
doidos, para que trouxésseis a este para fazer doidices diante de mim? há de
entrar este na minha casa?” (I Sm 21.1-15)
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