segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

O Reino de Deus não É Político – 2 Samuel 14


Nós vemos no 14º capítulo de 2 Samuel, que o interesse de Joabe pelo regresso de Absalão do exílio em Gesur, para Jerusalém, não era devido a qualquer amizade pessoal e simpatia que tivesse por ele, pois foi quem buscaria intensamente a sua morte, na rebelião contra Davi, mesmo contra uma ordem expressa deste para que fosse poupado com vida.
O interesse que moveu Joabe era de caráter político e não sentimental, porque Absalão era o sucessor natural de Davi ao trono, e as opiniões estavam divididas em Israel, quanto à necessidade do seu retorno para Israel, para que pudesse reinar no lugar do seu pai quando este morresse.
Assim, o interesse de Joabe em trazê-lo de volta visava à preservação da paz civil, de modo que se evitasse uma possível guerra futura na luta de sucessão ao trono.
Nós encontramos Absalão, no início deste 14º capítulo, ainda no exílio.
A sua busca por Davi, para ser o vingador do sangue de Amnom, havia cessado depois de passados três anos, e como as opiniões em Israel se dividiam a respeito dele, quanto a pesar os justos motivos que teria ou não para ter assassinado o seu irmão, e tendo Joabe notado que caso Davi morresse, poderia haver uma guerra civil em Israel, em razão de um partido que fosse a favor de trazer Absalão do exílio, então ele se antecipou a isto tomando providências para convencer Davi a reintegrá-lo no reino.  
Contudo, não sabia que o mal já havia construído um grande castelo no coração de Absalão, para reger todas as suas intenções de se vingar do seu próprio pai, não apenas pelo exílio a que fora submetido por ele, quanto a ter deixado Amnom impune no caso do seu incesto com Tamar.
E quando Joabe percebeu que o coração de Davi voltava a se inclinar para Absalão (v. 1), ele se apressou em trazer uma mulher sábia de Tecoa (v.2), mas não certamente sábia segundo Deus, mas segundo o mundo, no exercício da arte da política, e a pedido de Joabe, e por instrução deste, fingiu estar de luto por um dos seus filhos que disse ter sido morto pelo seu próprio irmão, e que sendo viúva e tendo somente a ele por arrimo, temia passar por sérias dificuldades, caso a sua parentela conseguisse vingar o sangue que ele havia derramado do seu irmão.
E ela insistiu veementemente com Davi para que não deixasse os vingadores do sangue matarem o único filho que lhe restara, e visava com isto dissuadir o próprio rei e toda a sua parentela de vingarem o sangue de Amnom, que havia sido derramado por Absalão.
E somente depois de ter obtido dele o compromisso de atender à sua petição, que ela lhe apresentou o caso de Absalão, e mostrou a Davi, do ponto de vista político, e não do de Deus, que a sua resistência em trazer Absalão de volta ao reino era na verdade contra o povo de Deus, e que Davi estava condenando a si mesmo, por não trazer de volta aquele que ele havia desterrado (v. 13).
As palavras proferidas pela mulher tecoíta no verso 14 podem parecer numa interpretação apressada como expressão da verdade, assim, este versículo não deve ser ensinado fora do contexto bíblico, no qual aprendemos que Deus tira sim a vida no exercício da Sua soberania, e nem sempre Ele cogita meios para que os banidos não permaneçam arrojados da Sua presença, afinal Ele tem afirmado que terá misericórdia de quem Lhe aprouver ter misericórdia, assim como Ele endurece a quem quer.
Ele tanto pode tirar a vida do corpo quanto fazer a alma perecer no inferno.
A sabedoria do mundo diz juntamente com a mulher tecoíta, contra a revelação de Deus registrada na Bíblia, que Ele é pai de todos os homens e que não pode trazer qualquer mal a eles em decorrência de ser o pai deles.
No entanto, cabe lembrar que a lei do goel, do vingador do sangue, que vigorava no Velho Testamento, para nossa instrução quanto ao caráter de Deus, foi prescrita por Ele e não por iniciativa de Moisés.
Os juízos de Deus, a propósito, começam pela Sua própria casa (I Pe 4.17), porque no equilíbrio justo da Sua misericórdia com os Seus juízos, nunca deixará a qualquer um dos seus verdadeiros filhos sem a devida correção, até mesmo se for necessária, pelo uso da morte física, como fizera com muitos na Igreja de Corinto, e que continua fazendo desde o início da criação.
Davi se deixou persuadir pelos argumentos da mulher, que na verdade, eram os argumentos de Joabe, e não consultou ao Senhor, senão os seus próprios sentimentos e conveniências políticas que envolviam a questão.
Tanto isto é verdade que Davi não havia perdoado plenamente a Absalão, pois apesar de ter ordenado a Joabe que o trouxesse de volta a Jerusalém, contudo proibiu que ele visse a sua face, e que se dirigisse para a sua própria casa (v. 23, 24).
A única referência que a Palavra de Deus faz à pessoa de Absalão é a de que ele era o homem de grande beleza em Israel e que não tinha qualquer defeito físico, sendo dono de uma cabeleira admirável (v. 25, 26).
Nada se diz de sua sabedoria e devoção a Deus.
É motivo de preocupação para os pais quando os seus filhos estão mais interessados na sua beleza física do que na virtude deles.
Depois de ter ficado dois anos em Jerusalém, sem poder ser admitido na presença do rei, e participar dos assuntos relativos ao reino, Absalão manifestou um interesse fingido de ver a face de seu pai, dizemos fingido, porque não era o arrependimento e o amor que o moviam a isto, mas o desejo de se vingar e suplantar Davi, e ele não poderia fazê-lo enquanto não fosse reempossado em sua antiga posição de ministro do rei.
Absalão havia aprendido com seu avô, rei de Gesur, a multiplicar cavalos e é por isso que nós o veremos logo no início do capítulo seguinte a este, provendo-se de um carro e cavalos, e cinquenta homens que corriam adiante dele pomposamente, para anunciarem a sua chegada aonde quer que ele fosse (15.1).
Era com este sonho de poder e glória em mira que ele mandou chamar Joabe para que tomasse providências para fazê-lo retornar à corte real.
Como este demorava em atender à sua chamada, ordenou aos seus servos que ateassem fogo no campo de Joabe, que ficava próximo à sua residência.
Foi com insolência ameaçadora que falou a Joabe quando este veio ter com ele para que apresentasse as razões do danos que lhe causara.
Talvez Joabe tenha se recusado a vir ter logo com Absalão quando este lhe chamou, em razão deste não ter se mostrado grato pelas providências que havia tomado para que pudesse retornar a Jerusalém.
Homens orgulhosos consideram os favores que nos prestam como dívida.
Mas em vez de Absalão mostrar gratidão, ele causou um dano a quem lhe havia beneficiado, e nem tampouco se dispôs a reparar o dano, fazendo uma compensação por ele (v. 28 a 39).
Pessoas nobres são sempre gratas, e nunca pesam os motivos daqueles que as têm beneficiado, e sempre manifestarão a sua gratidão pelo favor que tiverem recebido, ainda que saibam que aqueles que o praticaram o fizeram em causa própria ou por qualquer outro tipo de interesse.     




“1 Percebendo Joabe, filho de Zeruia, que o coração do rei estava inclinado para Absalão,
2 mandou a Tecoa trazer de lá uma mulher sagaz, e disse-lhe: Ora, finge que estás de nojo; põe vestidos de luto, não te unjas com óleo, e faze-te como uma mulher que há muitos dias chora algum morto;
3 vai ter com o rei, e fala-lhe desta maneira. Então Joabe lhe pôs as palavras na boca.
4 A mulher tecoíta, pois, indo ter com o rei e prostrando-se com o rosto em terra, fez-lhe uma reverência e disse: Salva-me, o rei.
5 Ao que lhe perguntou o rei: Que tens? Respondeu ela: Na verdade eu sou viúva; morreu meu marido.
6 Tinha a tua serva dois filhos, os quais tiveram uma briga no campo e, não havendo quem os apartasse, um feriu ao outro, e o matou.
7 E eis que toda a parentela se levantou contra a tua serva, dizendo: Dá-nos aquele que matou a seu irmão, para que o matemos pela vida de seu irmão, a quem ele matou, de modo que exterminemos também o herdeiro. Assim apagarão a brasa que me ficou, de sorte a não deixarem a meu marido nem nome, nem remanescente sobre a terra.
8 Então disse o rei à mulher: Vai para tua casa, e eu darei ordem a teu respeito.
9 Respondeu a mulher tecoíta ao rei: A iniquidade, ó rei meu senhor, venha sobre mim e sobre a casa de meu pai; e fique inculpável o rei e o seu trono.
10 Tornou o rei: Quem falar contra ti, traze-mo a mim, e nunca mais te tocará.
11 Disse ela: Ora, lembre-se o rei do Senhor seu Deus, para que o vingador do sangue não prossiga na destruição, e não extermine a meu filho. Então disse ele: Vive o Senhor, que não há de cair no chão nem um cabelo de teu filho.
12 Então disse a mulher: Permite que a tua serva fale uma palavra ao rei meu senhor. Respondeu ele: Fala.
13 Ao que disse a mulher: Por que, pois, pensas tu tal coisa contra o povo de Deus? Pois, falando o rei esta palavra, fica como culpado, visto que o rei não torna a trazer o seu desterrado.
14 Porque certamente morreremos, e seremos como águas derramadas na terra, que não se podem ajuntar mais; Deus, todavia, não tira a vida, mas cogita meios para que não fique banido dele o seu desterrado.
15 E se eu agora vim falar esta palavra ao rei meu senhor, e porque o povo me atemorizou; pelo que dizia a tua serva: Falarei, pois, ao rei; porventura fará o rei segundo a palavra da sua serva.
16 Porque o rei ouvirá, para livrar a sua serva da mão do homem que intenta exterminar da herança de Deus tanto a mim como a meu filho.
17 Dizia mais a tua serva: Que a palavra do rei meu senhor me dê um descanso; porque como o anjo de Deus é o rei, meu senhor, para discernir o bem e o mal; e o Senhor teu Deus seja contigo.
18 Então respondeu o rei à mulher: Peço-te que não me encubras o que eu te perguntar. Tornou a mulher: Fale agora o rei meu senhor.
19 Perguntou, pois, o rei: Não é verdade que a mão de Joabe está contigo em tudo isso? Respondeu a mulher: Vive a tua alma, ó rei meu senhor, que ninguém se poderá desviar, nem para a direita nem para a esquerda, de tudo quanto diz o rei meu senhor; porque Joabe, teu servo, é quem me deu ordem, e foi ele que pôs na boca da tua serva todas estas palavras;
20 para mudar a feição do negócio é que Joabe, teu servo, fez isso. Sábio, porém, é meu senhor, conforme a sabedoria do anjo de Deus, para entender tudo o que há na terra.
21 Então o rei disse a Joabe: Eis que faço o que pedes; vai, pois, e faze voltar o mancebo Absalão.
22 Então Joabe se prostrou com o rosto em terra e, fazendo uma reverência, abençoou o rei; e disse Joabe: Hoje conhece o teu servo que achei graça aos teus olhos, ó rei meu senhor, porque o rei fez segundo a palavra do teu servo.
23 Levantou-se, pois, Joabe, foi a Gesur e trouxe Absalão para Jerusalém.
24 E disse o rei: Torne ele para sua casa, mas não venha à minha presença. Tornou, pois, Absalão para sua casa, e não foi à presença do rei.
25 Não havia em todo o Israel homem tão admirável pela sua beleza como Absalão; desde a planta do pé até o alto da cabeça não havia nele defeito algum.
26 E, quando ele cortava o cabelo, o que costumava fazer no fim de cada ano, porquanto lhe pesava muito, o peso do cabelo era de duzentos siclos, segundo o peso real.
27 Nasceram a Absalão três filhos, e uma filha cujo nome era Tamar; e esta era mulher formosa à vista.
28 Assim ficou Absalão dois anos inteiros em Jerusalém, sem ver a face do rei.
29 Então Absalão mandou chamar Joabe, para o enviar ao rei; porém Joabe não quis vir a ele. Mandou chamá-lo segunda vez, mas ele não quis vir.
30 Pelo que disse aos seus servos: Vede ali o campo de Joabe pegado ao meu, onde ele tem cevada; ide, e ponde-lhe fogo. E os servos de Absalão puseram fogo ao campo:
31 Então Joabe se levantou, e veio ter com Absalão, em casa, e lhe perguntou: Por que os teus servos puseram fogo ao meu campo.
32 Respondeu Absalão a Joabe: Eis que enviei a ti, dizendo: Vem cá, para que te envie ao rei, a dizer-lhe: Para que vim de Gesur? Melhor me fora estar ainda lá. Agora, pois, veja eu a face do rei; e, se há em mim alguma culpa, que me mate.
33 Foi, pois, Joabe à presença do rei, e lho disse. Então o rei chamou Absalão, e ele entrou à presença do rei, e se prostrou com o rosto em terra diante do rei; e o rei beijou Absalão.” (II Sm 14.1-33).


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