Cerca de quatro meses haviam passado, de Chisleu - novembro (1.1) a Nisan
- março (2.1), desde que Neemias havia começado a jejuar e a orar, até que
fizesse o pedido ao rei, que está registrado neste 2º capítulo do seu livro,
que estaremos comentando.
Ele não se aventuraria a fazer uma viagem para Judá no inverno, porque
não seria uma ocasião oportuna para empreender tal viagem.
De igual modo, temos que esperar o momento oportuno para agirmos, depois
de termos jejuado e orado.
Há invernos espirituais que nos impõem este tempo de espera, se queremos
ser bem sucedidos em nossos projetos a serviço de Deus.
Além da direção e poder do Senhor, temos que ter inteligência espiritual
para discernir o movimento do mundo espiritual, para que não tomemos decisões
precipitadas, das quais não somente poderemos nos lamentar posteriormente, como
até mesmo vir a frustrar os projetos que Deus havia determinado realizar
através de nós.
Mas mesmo depois de ter muito jejuado e orado, o coração de Neemias se
achava em grande tristeza, por se encontrar assolada a cidade de Jerusalém.
E é desta forma que se acharão todos aqueles que estiverem exilados,
ainda que dentro de suas próprias igrejas, porque assim como a cidade de
Jerusalém estava para os judeus na Antiga Aliança, a Igreja está para os cristãos
na Nova.
Quão profundas são as dores do exílio. Elas são indescritíveis e muito
maiores do que qualquer dor moral ou física, porque são produzidas pela
impossibilidade de se adorar a Deus em espírito e em verdade, na comunhão dos
santos, por causa das condições prevalecentes na Igreja, quando esta se
encontra assolada e em ruínas, por ter sido pisada como sal que perdeu o sabor.
É muito mais difícil restaurar uma Igreja caída do que reconstruir os
muros de Jerusalém. É com muito maior fúria que Satanás e todo o inferno se
opõem a esta restauração da Igreja, do que a que experimentaram Esdras e
Neemias em seus dias.
Primeiro, porque que a proposta de Deus para a Igreja na dispensação da graça,
para que possa andar conforme o Seu agrado é muito maior do que a que se exigia
dos aliançados do antigo pacto, pois a justiça da Igreja de Cristo deve exceder
em muito a dos escribas e fariseus.
Entretanto, há muitas lições que podemos aprender do exemplo de tudo o
que Deus fez através de Neemias,para restaurar a vida religiosa de Israel.
A primeira é a de que apesar de Neemias saber que necessitaria do apoio
do rei e de muitos homens, a sua confiança não estava depositada em nenhum
deles, mas somente no Senhor, e demonstrou isto reiteradas vezes, como se vê
por exemplo no verso 5, quando não ousou declarar logo ao rei qual era o seu
intento, quando este lhe indagou o que desejava dele.
Neemias fez uma oração rápida em espírito, entre a pergunta e a resposta
que daria, entregando certamente o caso nas mãos de Deus, e declarou logo em
seguida o que desejava, mas não sem antes, fazer a introdução em que usou as
seguintes palavras: “se teu servo tiver achado graça diante de ti”, como a que
dizer que ele atenderia ao que pediria, caso Deus tivesse movido o coração do
rei para que achasse graça diante dele.
Isto é dependência real de Deus, tal como havia sido demonstrada
anteriormente, por Davi em seus dias, que não costumava tomar qualquer decisão
sem que tivesse entregado antes o caso nas mãos do Senhor.
Não podemos esquecer que Ester havia conquistado totalmente o favor do
rei da Pérsia, quando se casou com ele, e isto foi feito estrategicamente por
Deus não somente para livrar os israelitas do extermínio intentado por Hamã,
como também para que os judeus encontrassem o favor dos persas, na sua estada
na Palestina, e nisto nós vemos como o rei foi favorável, tanto nos dias de
Esdras, quanto nos de Neemias, e muito disto foi obtido, sem dúvida, pelo modo
atencioso como os persas passaram a ver os judeus, por influência da piedosa
Ester, que havia assumido o trono, ao lado do rei da Pérsia.
Toda esta boa influência estava sendo produzida pelo próprio Senhor.
Neemias pediu uma comissão para ir com ele, para reconstruir os muros de
Jerusalém, e lá permaneceria um certo tempo aprazado, conforme lhe havia pedido
o rei, mas este prazo foi prolongado, porque permaneceu em Jerusalém, cerca de
doze anos (5.14).
Além desta comissão, pediu também uma escolta (v.7), e um salvo conduto
para que os governadores das províncias, não somente permitissem que
atravessasse as suas províncias respectivas, como também que o provessem com o
que fosse necessário, especialmente, madeira do Líbano, para o trabalho que
havia projetado.
Quando Neemias entregou as cartas do rei persa aos governantes das
províncias (v. 9), Sambalate e Tobias (que viriam a ser instrumentos de
Satanás, para se oporem a ele) ficaram sabendo da sua missão, e extremamente irados, pelo fato de que alguém
tivesse se levantado para procurar o bem dos israelitas (v. 10).
Depois que chegou a Jerusalém, Neemias não declarou o que Deus havia
colocado em seu coração (v. 12) a nenhum dos líderes de Israel, por pelo menos
três dias (v.11).
Homens em verdadeira missão divina, nunca fazem alarde de sua autoridade,
e da comissão que receberam da parte de Deus, porque sabem que a obra não é
propriamente deles, mas do Senhor (v. 16).
Antes de tomar qualquer decisão, Neemias fez uma avaliação da extensão
dos danos do muro de Jerusalém, que estava demolido, assim como suas portas,
que haviam sido queimadas. E por motivo de prudência, fez isto à noite (v.
13).
Foi somente no momento oportuno, que declarou aos judeus, especialmente
aos sacerdotes, nobres e magistrados e a todos os que faziam a obra de
reconstrução do muro, qual era a obra, para a qual havia sido encarregado por
Deus, para fazer em Jerusalém.
Daqui, decorre um princípio muito importante, para todos os que têm uma
chamada de Deus, para a realização de uma obra específica: ela deve ser
reconhecida e apoiada pelos demais líderes que estiverem envolvidos nela.
Quando falta este reconhecimento e apoio, será vão tentar nadar contra a
correnteza.
Por isso Paulo não poderia prosseguir seu ministério juntamente com
Barnabé, porque passou a existir discordância entre ambos quanto à forma de
condução da obra de evangelização, para a qual haviam sido encarregados pela
Igreja de Antioquia, especialmente, por terem um entendimento diverso quanto à
participação de João Marcos em seus empreendimentos missionários.
Nenhum pastor será bem sucedido em seu ministério, se não tiver o apoio
da Igreja, e especialmente dos seus auxiliares diretos.
Quando Neemias fez uma exposição quanto ao modo como a boa mão do Senhor
fora com ele, particularmente quanto à comissão que havia recebido do rei
persa, os judeus se dispuseram a cooperar com ele na obra que deveria ser
realizada (v. 17,18).
Mas quando Sambalate, Tobias e Gesem o souberam, começaram a zombar deles
e a desprezá-los infamando-lhes e acusando-lhes de estarem se rebelando contra
o rei persa.
Não é de se admirar que o diabo sempre use o argumento de insurreição
contra a autoridade constituída, quando Deus levanta alguém para fazer a Sua
vontade.
A mesma autoridade que os verdadeiros rebeldes costumam transgredir,
especialmente a relativa à da própria Palavra de Deus, que eles não amam e
obedecem, é a que eles costumam invocar para tentarem desencorajar os servos
fiéis de Deus a prosseguirem adiante na defesa da verdade (v. 20).
Satanás sempre projeta manter os cristãos e a Igreja em estado de miséria
espiritual, e tudo faz para tentar impedir o avanço de uma verdadeira
espiritualidade, que seja baseada no amor e na prática da verdade.
Ele tudo apoiará e não perturbará os cristãos, desde que se mantenham na
sua carnalidade, e não busquem santificar suas vidas na verdade da Palavra de
Deus.
Se os cristãos deixarem os muros de suas vidas caídos, em total ruína,
Satanás não se levantará contra eles, mas ao menor movimento para tentarem
reconstruí-los, ele logo se manifestará apresentando todo tipo de oposição a
eles.
Mas, em vez de deixarmos que ele nos intimide, devemos fazer como fizera
Neemias, que respondeu o seguinte aos seus inimigos, em face das suas
acusações: “O Deus do céu é que nos fará prosperar; e nós, seus servos, nos
levantaremos e edificaremos: mas vós não tendes parte, nem direito, nem
memorial em Jerusalém.” (v. 20).
Isto é o que deve estar sempre bem definido e fixado diante de nós: não podemos
permitir que nossos opositores, que são inimigos de Deus, se coloquem ao nosso
lado na realização da obra que Ele nos encarregou para fazer.
Devemos ter uma firme confiança, somente nEle, que assim como Ele nos
chamou, também é poderoso para nos fazer prosperar no que nos tem ordenado.
Mas em vez de ficarmos esperando com os braços cruzados, devemos nos
levantar e edificar as pedras vivas do edifício espiritual que fomos chamados a
construir como seus cooperadores.
“Porque nós somos cooperadores de Deus; vós sois lavoura de Deus e
edifício de Deus.” (I Cor 3.9).
É preciso ter muita prudência e inteligência espiritual, quando estamos
encarregados por Deus para uma obra específica, como teve Neemias, para não
darmos munição ao Inimigo, de modo que não leve vantagem sobre nós.
O diabo acompanha nossos passos e levanta seus instrumentos para
espreitar a liberdade que temos em Cristo, de maneira a barrar o nosso
progresso com infâmias, perseguições e acusações mentirosas.
Se ele não conseguir nos deter de um modo, tentará outros meios para
alcançar os seus objetivos, que não são dirigidos propriamente contra as nossas
pessoas, mas contra a obra que Deus designou fazer através de nós.
Daí se recomendar aos cristãos, e
especialmente àqueles que estão à frente de algum trabalho do Senhor, que
vigiem e orem em todo o tempo, e que sejam perseverantes, a par de todas as
perseguições que possam vir a sofrer.
Mas alguém dirá: “E se a perseguição vier exatamente da parte daqueles
que foram levantados para liderarem a obra de Deus?”. “O que devem fazer os cristãos
que se encontram debaixo da liderança deles?”.
Primeiro, devem orar e jejuar para que saiam do laço do Inimigo, com o
qual foram encantados e amarrados.
Se as coisas persistirem por longo tempo e se agravarem a ponto de a
Igreja se desviar totalmente dos objetivos de Deus traçados para ela,
notadamente o que se refere a andar na prática da verdade, então é hora de
começar a orar para receber direção do Senhor, para congregar numa Igreja que
não tenha apostatado da verdade.
D. M. Lloyd Jones, já em 1963 nos alertava sobre o que ocorreria se o
movimento ecumênico chegasse a desenvolver “a grande Igreja mundial”, porque a
palavra “cisma” seria usada contra todo aquele que se recusar a ser parte integrante
desta organização gigantesca, que começava a ser costurada em seus dias, e que
tem tomado uma maior dimensão em nossos dias.
Ele afirmava que devíamos ter clara percepção quanto a isso, e que
deveríamos instruir o povo a que servimos sobre esta importantíssima questão,
porque cisma é um grande pecado, uma coisa muito grave, da qual ninguém deveria
fazer-se culpado, e por isso devemos compreender com clareza o que é exatamente
cisma.
Muitos cristãos que se encontram exilados em suas próprias Igrejas,
seriam muito auxiliados se lessem o tratado que John Owen escreveu sobre cisma.
Nós deixamos Neemias no capítulo anterior chorando e orando diante de
Deus por causa da miséria em que se encontrava o povo de Deus na Palestina. Mas
ele não parou nisso, de modo que nós o encontramos neste capítulo e nos demais,
tomando medidas práticas para reparar as coisas que necessitavam ser
consertadas e edificadas.
Assim deve ser a vida do cristão. Ele não deve simplesmente interceder em
favor de todas as pessoas, e chorar pela miséria em que se encontra o mundo de
trevas, mas deve se esforçar de modo prático para ser um agente nas mãos de
Deus, para a transformação daqueles que têm sido chamados por Ele, do mundo
para a salvação em Cristo Jesus, bem como para serem sal e luz num mundo que
tende à putrefação e às trevas totais.
“1 Sucedeu, pois, no mês de nisã, no ano vigésimo do rei Artaxerxes,
quando o vinho estava posto diante dele, que eu apanhei o vinho e o dei ao rei.
Ora, eu nunca estivera triste na sua presença.
2 E o rei me disse: Por que está triste o teu rosto, visto que não estás
doente? Não é isto senão tristeza de coração. Então temi sobremaneira.
3 e disse ao rei: Viva o rei para sempre! Como não há de estar triste o
meu rosto, estando a cidade, o lugar dos sepulcros de meus pais, assolada, e
tendo sido consumidas as suas portas pelo fogo?
4 Então o rei me perguntou: Que me pedes agora? Orei, pois, ao Deus do
céu,
5 e disse ao rei: Se for do agrado do rei, e se teu servo tiver achado
graça diante de ti, peço-te que me envies a Judá, à cidade dos sepulcros de
meus pais, para que eu a reedifique.
6 Então o rei, estando a rainha assentada junto a ele, me disse: Quanto
durará a tua viagem, e quando voltarás? E aprouve ao rei enviar-me,
apontando-lhe eu certo prazo.
7 Eu disse ainda ao rei: Se for do agrado do rei, deem-se-me cartas para
os governadores dalém do Rio, para que me permitam passar até que eu chegue a
Judá;
8 como também uma carta para Asafe, guarda da floresta do rei, a fim de
que me dê madeira para as vigas das portas do castelo que pertence à casa, e
para o muro da cidade, e para a casa que eu houver de ocupar. E o rei mas deu,
graças à mão benéfica do meu Deus sobre mim.
9 Então fui ter com os governadores dalém do Rio, e lhes entreguei as cartas
do rei. Ora, o rei tinha enviado comigo oficiais do exército e cavaleiros.
10 O que ouvindo Sambalate, o horonita, e Tobias, o servo amonita,
ficaram extremamente agastados de que alguém viesse a procurar o bem dos filhos
de Israel.
11 Cheguei, pois, a Jerusalém, e estive ali três dias.
12 Então de noite me levantei, eu e uns poucos homens comigo; e não
declarei a ninguém o que o meu Deus pusera no coração para fazer por Jerusalém.
Não havia comigo animal algum, senão aquele que eu montava.
13 Assim saí de noite pela porta do vale, até a fonte do dragão, e até a
porta do monturo, e contemplei os muros de Jerusalém, que estavam demolidos, e
as suas portas, que tinham sido consumidas pelo fogo.
14 E passei adiante até a porta da fonte, e à piscina do rei; porém não
havia lugar por onde pudesse passar o animal que eu montava.
15 Ainda de noite subi pelo ribeiro, e contemplei o muro; e virando,
entrei pela porta do vale, e assim voltei.
16 E não souberam os magistrados aonde eu fora nem o que eu fazia; pois até
então eu não havia declarado coisa alguma, nem aos judeus, nem aos sacerdotes,
nem aos nobres, nem aos magistrados, nem aos demais que faziam a obra.
17 Então eu lhes disse: Bem vedes vós o triste estado em que estamos,
como Jerusalém está assolada, e as suas portas queimadas a fogo; vinde, pois, e
edifiquemos o muro de Jerusalém, para que não estejamos mais em opróbrio.
18 Então lhes declarei como a mão do meu Deus me fora favorável, e bem
assim as palavras que o rei me tinha dito. Eles disseram: Levantemo-nos, e
edifiquemos. E fortaleceram as mãos para a boa obra.
19 O que ouvindo Sambalate, o horonita, e Tobias, o servo amonita, e
Gesem, o arábio, zombaram de nós, desprezaram-nos e disseram: O que é isso que
fazeis? Quereis rebelar-vos contra o rei?
20 Então lhes respondi: O Deus do céu é que nos fará prosperar; e nós,
seus servos, nos levantaremos e edificaremos: mas vós não tendes parte, nem
direito, nem memorial em Jerusalém.” (Ne 2.1-20).
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