Tal era o desencanto de Salomão em relação à vida, pelo que viu da
injustiça que há nos corações dos homens, que não chegou a entender os
desígnios de Deus, na manifestação do Seu poder, graça e misericórdia, bem como
dos Seus juízos, num mundo que havia ficado sujeito ao pecado desde Adão, e
diferentemente de seu pai, Davi, que clamava por justiça ao Senhor, e por
livramentos dos oprimidos, inclusive dele próprio debaixo da perseguições e
pressões que sofria, Salomão preferiu filosofar sobre tal realidade opressiva,
e chegou à conclusão de que era melhor nem sequer chegar à existência do que
viver num mundo sujeito à opressão, ou então, considerava mais felizes os que
já haviam morrido, do que aqueles que ainda estavam vivos (v. 1 a 3).
Seria compreensível que tivesse escrito isto numa forma de
lamento, tal como fizera Jó, Jeremias e outros, quando estiveram debaixo de
grandes aflições, no entanto, eles não filosofaram friamente acerca disso,
porque estavam na verdade abrindo seus corações diante de Deus, desabafando
quanto às suas condições, mas sem perderem a esperança de livramento, porque
chegaram a compreender que Deus tem um bom propósito de nos fornecer
aperfeiçoamento espiritual através de tais tribulações.
Então, para um cristão esclarecido, não há calamidades, mas
oportunidades de crescimento em todas as vicissitudes desta vida.
Por isso o cristão não é um pacifista que tenta melhorar o mundo,
porque o mundo sempre seguirá o seu curso, aumentando cada vez mais na
multiplicação da iniquidade, mas é um pacificador, ou seja, alguém que prega a
paz que há em Cristo, para aqueles que pretenderem deixar as trevas que há no
mundo.
A partir do verso 4 deste capitulo nós encontramos algumas
citações proverbiais que foram escritas por Salomão.
Ele afirma no verso 4 que todo trabalho e toda destreza em obras
provêm da inveja que o homem tem do seu próximo, e que isso é também vaidade e
um desejo vão.
Não padece dúvida de que muitas das realizações humanas são
movidas pela inveja, no desejo de superação do próximo.
Todavia, não podemos fazer disso uma regra geral, porque
especialmente os cristãos sinceros tudo fazem por amor a Deus e para Sua
glória, e por amor ao próximo.
Mas vivendo cercado por uma rede de intrigas dos muitos nobres que
compunham a sua corte, Salomão restringiu o seu campo de análise ao que havia
de pior na humanidade e não naquilo que há de melhor nela.
É espantoso o relato que encontramos no livro de I Reis quanto às
provisões diárias que eram necessárias, para alimentar todos os que compunham a
corte do rei Salomão, e todas as tribos de Israel tinham que se revezar na
produção de alimentos para alimentá-los com quantidades fixadas e vigiadas por
superintendentes que foram colocados pelo rei sobre eles, de forma que para
sustentá-los foram fixados pesados impostos sobre o povo, que eram
insuportáveis a ponto de terem servido de motivo para a ruptura das demais
tribos do Norte com Judá e Benjamin, para se colocarem debaixo do reinado de
Jeroboão.
Nos versos 5 e 6 lemos que aquele que é preguiçoso faz mal à sua
própria carne, porque não se alimentará corretamente, porque pensa que é melhor
um pouco de pão com tranquilidade, do que ter ambas as mãos cheias com trabalho
e correr atrás do vento.
De fato é uma grande tolice preferir viver em penúria do que ser
diligente em trabalhar, a pretexto de se amar a tranquilidade, porque Deus não
aprova tal tipo falso de tranquilidade, que é muito parecido com a atitude
daqueles que não trabalham por alegarem viverem pela fé de que Deus lhes
proverá de tudo o que for necessário. Todavia, o Senhor tem imposto ao homem
que comerá o seu pão com o suor do seu rosto, e isto é indicativo de que Ele
suprirá todas as suas necessidades, desde que trabalhe, conforme Ele o tem
determinado.
Por outro lado é apontado um extremo que é o oposto deste citado,
nos versos 7 e 8, que consiste em muito se trabalhar, sem cuidar do estado da
alma, por se amar as riquezas como um fim em si mesmo, e sem ter com quem
compartilhá-la.
Nos versos 9 a 12 é ensinada a superioridade do trabalho em
conjunto sobre o individual. Especialmente na obra de Deus não existe uma tal
coisa como a de obreiro independente e isolado.
O Senhor nos tem ordenado que vivamos congregados como um rebanho
unido, em justa cooperação, e atuando como um só espírito.
Há grande vantagem nisto para cooperação mútua, e para que não
haja derrota especialmente nas investidas do Inimigo, que terá muito maior
dificuldade para derrotar um corpo de cristãos unidos, do que um cristão que
viva isoladamente.
Nos versos 13 e 14 Salomão escreveu um provérbio que teria evitado
a sua queda no pecado no final de sua vida caso o aplicasse a si mesmo, porque
diz que:
“Melhor é o mancebo pobre e sábio do que o rei velho e insensato,
que não se deixa mais admoestar, embora tenha saído do cárcere para reinar, ou
tenha nascido pobre no seu próprio reino.” (v. 13 e 14)
É provável que os versos 15 e 16 tenham sido escritos por Salomão
inspirando-se no seu próprio caso, porque poderia estar falando melancolicamente
sobre as muitas reclamações que estavam sendo levantadas contra o seu reinado,
e pela aspiração do povo pelo levantamento de um novo regente no seu lugar, no
caso o seu filho Roboão que era ainda muito jovem, e ele via nisto que se
desencantariam com o jovem, tanto quanto haviam ficado insatisfeitos com ele, e
por isso classificou tal atitude de vaidade e desejo vão.
Não foi esta a condição com que Davi, seu pai o conduziu ao reino
em seu lugar, quando ainda o próprio Salomão era muito jovem, porque Davi
morreu em ditosa velhice, na presença de Deus, e certo em relação à Sua vontade
de que deveria fazer de Salomão seu sucessor.
Mas desviado da presença de Deus, como Salomão se encontrava, como
poderia saber em paz qual era a Sua vontade em relação a quem lhe deveria
suceder no trono?
Como vimos antes, isto seria feito debaixo de um juízo de Deus,
tendo a dois jovens por sucessores, porque por causa da sua idolatria, o reino
de Israel seria dividido, e seu filho Roboão o sucederia no Sul, e Jeroboão
começaria a reinar no novo reino que seria formado no Norte.
“1 Depois volvi-me, e atentei para todas as opressões que se fazem
debaixo do sol; e eis as lágrimas dos oprimidos, e eles não tinham consolador;
do lado dos seus opressores havia poder; mas eles não tinham consolador.
2 Pelo que julguei mais felizes os que já morreram, do que os que
vivem ainda.
3 E melhor do que uns e outros é aquele que ainda não é, e que não
viu as más obras que se fazem debaixo do sol.
4 Também vi eu que todo trabalho e toda destreza em obras provêm
da inveja que o homem tem do seu próximo. Também isso é e vaidade e desejo vão.
5 O tolo cruza as mãos, e come a sua própria carne, dizendo:
6 Melhor é um punhado com tranquilidade do que ambas as mãos
cheias com trabalho e correr atrás do vento.
7 Outra vez me volvi, e vi outra vaidade debaixo do sol, isto é:
8 Há um homem que é só, não tendo parente; não tem filho nem irmão
e, contudo, de todo o seu trabalho não há fim, nem os seus olhos se fartam de
riquezas. E ele não pergunta: Para quem estou trabalhando e privando do bem a
minha alma? Também isso é vaidade e enfadonha ocupação.
9 Melhor é serem dois do que um, porque têm melhor paga do seu
trabalho.
10 Pois se caírem, um levantará o seu companheiro; mas ai do que estiver
só, pois, caindo, não haverá outro que o levante.
11 Também, se dois dormirem juntos, eles se aquentarão; mas um só
como se aquentará?
12 E, se alguém quiser prevalecer contra um, os dois lhe
resistirão; e o cordão de três dobras não se quebra tão depressa.
13 Melhor é o mancebo pobre e sábio do que o rei velho e
insensato, que não se deixa mais admoestar,
14 embora tenha saído do cárcere para reinar, ou tenha nascido
pobre no seu próprio reino.
15 Vi a todos os viventes que andavam debaixo do sol, e eles
estavam com o mancebo, o sucessor, que havia de ficar no lugar do rei.
16 Todo o povo, à testa do qual se achava, era inumerável; contudo
os que lhe sucederam não se regozijarão a respeito dele. Na verdade também isso
é vaidade e desejo vão.”
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