Jó mais uma vez protesta contra o erro teológico de
seus amigos, quanto ao ensino da correção imediata dos ímpios por Deus, como
vemos no capítulo 21.
Ele comprova, que ao contrário dos que amam a Deus,
os ímpios não são corrigidos e disciplinados pelo Senhor, enviando-lhes
aflições, tal como sucede aos justos.
Nisto Jó estava correto, porque é verdade que Deus
corrige somente aos Seus filhos, de maneira que se afirma na epístola aos
Hebreus que caso algum cristão não seja participante desta disciplina divina
que é comum a todos os Seus filhos, é porque é bastardo e não verdadeiramente
filho.
O apóstolo Pedro afirma que o juízo de Deus começa
pela Sua própria casa, a saber, pelos cristãos.
E o apóstolo Paulo diz que os cristãos são julgados
pelo Senhor para não serem condenados juntamente com o mundo.
Portanto, ao contrário do que imaginavam os amigos
de Jó, são justamente os que temem a Deus que estão sujeitos a correções que
podemos chamar de certo modo, de imediatas, da parte do Senhor, porque se
cumprem enquanto ainda se encontram neste mundo, mas isto não se aplica ao caso
dos ímpios que não se arrependem, porque sofrerão um castigo eterno, e não se
sujeitariam a qualquer disciplina que lhes fosse imposta por Deus.
Jó manifestou abertamente qual era o pensamento que
os seus três amigos estavam abrigando em seus corações em relação a ele nos
verso 28:
“Pois dizeis: Onde está a casa do príncipe, e onde a
tenda em que morava o ímpio?”
Eles haviam afirmado isto várias vezes em seus
discursos condenatórios contra ele, porque era o que abrigavam em seus corações
contra ele próprio, Jó, pensando desta mesma forma. Porque Jó era príncipe, e
havia sido despojado da sua honra e glória terrenas.
Por causa da sua doença deve ter sido retirado do
convívio em sua própria casa e dos aposentos confortáveis que o abrigavam. E
daí indagarem em seus corações onde estava a tenda em que ele, o ímpio Jó
morava?
Mas a resposta de Jó para esta indagação absurda e
injusta, era uma chamada à reflexão para eles, em forma de pergunta, como vemos
nos versos 29 e 30:
“29
Porventura não perguntastes aos viandantes? e não aceitais o seu testemunho,
30 de que o mau é preservado no dia da destruição, e
poupado no dia do furor?”
No entanto, Jó não invejava esta falsa e passageira
prosperidade dos ímpios, porque sabia qual seria no final o juízo eterno que
aguardava por todos eles, de maneira que o expressou com as seguintes palavras:
“Vede, porém, que eles não têm na mão a
prosperidade; esteja longe de mim o conselho dos ímpios!” (v. 16)
À luz destas verdades, quem deveria desconfiar do
desconforto de sua posição diante de Deus não era Jó, mas justamente seus três
amigos, que estavam se gloriando da prosperidade permanente deles.
Era para desconfiarem, se afinal não estavam
alinhando com os ímpios, sob a capa de uma falsa religiosidade.
Não eram assim os escribas e fariseus dos dias de
Jesus?
E muitos religiosos de nossos dias?
Eles são lobos vorazes vestidos de ovelhas.
Falam em defesa de Deus e da religião mas seus
corações estão distantes do Senhor, porque na verdade, são ímpios cheios de
cobiça mundana.
Por isso Jó vinha lhes advertindo repetidamente
sobre a hipocrisia e falsidade deles, conforme vemos também no último versículo
deste capitulo:
“Como, pois, me ofereceis consolações vãs, quando
nas vossas respostas só resta falsidade?” (v. 34)
É bem provável que a afirmação de Deus que
encontramos no último capítulo do livro de Jó, em relação a seus três amigos,
de que a Sua ira se havia acendido contra eles, bem pode ter sido um modo de
confirmar que eles não passavam de ímpios, porque os trataria segundo a própria
teologia deles, de que Deus não deixa viver o ímpio e que logo o destrói neste
mundo.
No entanto, lhes mostrou que é longânimo para com os
ímpios, com os vasos de ira, exatamente por causa dos justos, especialmente de
suas intercessões em favor deles, motivo porque mandou Jó interceder por eles
para que não fossem mortos.
É importante observar que Eliú foi excluído disto,
porque apesar de ter atacado a Jó não sustentou esta falsa teologia de que o
justo é sempre poupado neste mundo, e que Deus destrói logo os ímpios, tal como
afirmavam os três amigos de Jó.
“1 Então Jó respondeu:
2 Ouvi atentamente as minhas palavras; seja isto a
vossa consolação.
3 Sofrei-me, e eu falarei; e, havendo eu falado,
zombai.
4 É porventura do homem que eu me queixo? Mas, ainda
que assim fosse, não teria motivo de me impacientar?
5 Olhai para mim, e pasmai, e ponde a mão sobre a
boca.
6 Quando me lembro disto, me perturbo, e a minha
carne estremece de horror.
7 Por que razão vivem os ímpios, envelhecem, e ainda
se robustecem em poder?
8 Os seus filhos se estabelecem à vista deles, e os
seus descendentes perante os seus olhos.
9 As suas casas estão em paz, sem temor, e a vara de
Deus não está sobre eles.
10 O seu touro gera, e não falha; pare a sua vaca, e
não aborta.
11 Eles fazem sair os seus pequeninos, como a um
rebanho, e suas crianças andam saltando.
12 Levantam a voz, ao som do tamboril e da harpa, e
regozijam-se ao som da flauta.
13 Na prosperidade passam os seus dias, e num
momento descem ao Seol.
14 Eles dizem a Deus: retira-te de nós, pois não
desejamos ter conhecimento dos teus caminhos.
15 Que é o Todo-Poderoso, para que nós o sirvamos? E
que nos aproveitará, se lhe fizermos orações?
16 Vede, porém, que eles não têm na mão a
prosperidade; esteja longe de mim o conselho dos ímpios!
17 Quantas vezes sucede que se apague a lâmpada dos
ímpios? que lhes sobrevenha a sua destruição? que Deus na sua ira lhes reparta
dores?
18 que eles sejam como a palha diante do vento, e
como a pragana, que o redemoinho arrebata?
19 Deus, dizeis vós, reserva a iniquidade do pai
para seus filhos, mas é a ele mesmo que Deus deveria punir, para que o conheça.
20 Vejam os seus próprios olhos a sua ruína, e beba
ele do furor do Todo-Poderoso.
21 Pois, que lhe importa a sua casa depois de morto,
quando lhe for cortado o número dos seus meses?
22 Acaso se ensinará ciência a Deus, a ele que julga
os excelsos?
23 Um morre em plena prosperidade, inteiramente
sossegado e tranquilo;
24 com os seus baldes cheios de leite, e a medula
dos seus ossos umedecida.
25 Outro, ao contrário, morre em amargura de alma,
não havendo provado do bem.
26 Juntamente jazem no pó, e os vermes os cobrem.
27 Eis que conheço os vossos pensamentos, e os maus
intentos com que me fazeis injustiça.
28 Pois dizeis: Onde está a casa do príncipe, e onde
a tenda em que morava o ímpio?
29 Porventura não perguntastes aos viandantes? e não
aceitais o seu testemunho,
30 de que o mau é preservado no dia da destruição, e
poupado no dia do furor?
31 Quem acusará diante dele o seu caminho? e quem
lhe dará o pago do que fez?
32 Ele é levado para a sepultura, e vigiam-lhe o
túmulo.
33 Os torrões do vale lhe são doces, e o seguirão
todos os homens, como ele o fez aos inumeráveis que o precederam.
34 Como, pois, me ofereceis consolações vãs, quando
nas vossas respostas só resta falsidade?” (Jó 21)
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