Não foi somente pensando
na honra de seu filho que havia morrido, de modo que o seu nome fosse perpetuado em Israel, que
Noemi aconselhou Rute a ir ter com Boaz, planejando que esta viesse a se casar
com ele, na condição de remidor e perpetuador do nome de seu filho sobre a sua
própria herança, através dos filhos que Rute viesse a conceber de Boaz.
Dizemos que certamente
não foi esta a única razão do conselho de Noemi a Rute, porque havia uma
sincera preocupação com o futuro e a felicidade dela.
Noemi havia decidido
permanecer em viuvez perpétua em razão da sua idade avançada, mas Rute era
jovem e tinha ainda toda uma jornada à sua frente.
E o estado de casado é um
estado de descanso para as pessoas jovens, cujos afetos apaixonados
particularmente pertinentes à juventude ficarão vagando caso o coração não
esteja em repouso. E não há melhor lugar de descanso para um homem do que o
coração da sua esposa, e vice-versa.
Noemi encorajou Rute a
recorrer a Boaz porque se ele havia demonstrado bondade e justiça num assunto
menor, muito mais seria de se esperar dele a mesma bondade e justiça num
assunto maior como o de suscitar descendência ao filho de Noemi e de reaver
como resgatador a posse da propriedade que lhe pertencia por direito divino,
constante da Lei de Moisés (Dt 25.7-9).
Confiando na retidão do
caráter de Boaz Noemi aconselhou Rute a se colocar próximo dele, como a
lembrá-lo que na condição de remidor, cabia-lhe tomá-la por esposa, mas também
segundo o caráter reto de Rute, recomendou-lhe que não expusesse a conhecimento
público a sua honra, e que a aproximação íntima fosse feita em
demonstração de recato e humildade, pois
que em vez de se deitar ao lado dele, deveria fazê-lo aos seus pés.
De igual modo devemos nos
colocar aos pés do nosso Remidor, o Senhor Jesus Cristo, confiando inteiramente
na Sua bondade e misericórdia para que em nossa união matrimonial com Ele
possamos entrar na posse da herança que havíamos perdido em razão do pecado
original.
Boaz, depois de ter
supervisionado o joeiramento da cevada e tendo comido e se alegrado em Deus
pela boa e grande colheita que lhe fora concedida, recolheu-se para dormir no
próprio local de trabalho, junto à palha de um dos seus celeiros, e não se
retirou para sua casa, provavelmente em razão do avançado da hora, e tendo em
vista não perder tempo para as atividades do dia seguinte.
Isto foi providencial e
facilitou grandemente o cumprimento de tudo que Noemi havia recomendado a
Rute. E deitando aos pés de Boaz,
demonstrou que estava debaixo da proteção dele, como sendo a pessoa designada
pela lei divina para ser o seu protetor e remidor.
E por reconhecer que não
havia nenhuma intenção interesseira em Rute, senão a expressão da mais elevada
virtude de quem não estava buscando honra para si mesma mas para o nome de seu
ex-marido e da família dele, Boaz decidiu atender à petição de ser o remidor
casando-se com ela (v. 11), desde que o parente mais próximo de Noemi, ao qual
cabia a precedência do ato de remissão, renunciasse ao seu direito em favor de
Boaz (v. 12).
Nós vemos nisto tudo,
decência, diligência, honestidade e prudência. Quem dera, todas as nossas
grandes ou pequenas decisões fossem tomadas pensando-se tudo o que é justo
relativamente a cada uma delas.
E sob a condição
considerada e declarada Boaz se comprometeu solenemente em se casar com Rute, e
estava assumindo junto a ela um contrato do qual não voltaria atrás, ainda que
firmado apenas com palavras e sem a presença de testemunhas.
Isto é o que significa
sim, sim, não, não: o cumprimento daquilo que a boca tem proferido e prometido,
sem enganos, sem rodeios e mentiras.
A fidelidade e a retidão
de caráter podem ser medidos, pelo tanto que a pessoa age em conformidade com
as suas palavras.
E além de tudo Boaz se
esforçou para preservar a honra de Rute, de modo que não se soubesse que ela
estivera com ele, evitando assim todo comentário malicioso possível e toda
aparência do mal (v. 14).
Como reafirmação do seu
cuidado e bondade para com ela e sua sogra não a despediu vazia, pois cuidou de
prover o alimento necessário para ambas (v. 15), ainda que não tivesse a
certeza absoluta da consolidação do seu casamento com Rute, pois ainda haveria
de consultar o parente mais achegado de Elimeleque, ao qual cabia a precedência
no ato de remissão.
Quando Rute relatou a
Noemi o modo com o qual Boaz lhe havia tratado, esta, em sua longa experiência
de vida, entendeu que Rute havia conquistado o coração de Boaz, e que ele não
se daria descanso e se empenharia por todos os meios em não apenas cumprir o
seu papel de remidor, mas sobretudo o desejo de se unir àquela mulher que Deus
em Sua providência havia dirigido até ele para ser amada e também ser sua fiel
companheira.
E assim a história
daqueles que se aproximariam do Grande Remidor, em todas as nações, tinham
nesta história de amor, uma prefiguração daquele amor que Cristo tem por todos
aqueles que são atraídos pelo Pai até Ele, os quais são recebidos como noiva
amada de um Esposo amoroso.
Ele não é apenas um mero
Resgatador por um dever que impôs a Si mesmo na aliança eterna que fizera em
relação a nós com o Pai e o Espírito Santo, mas nos resgata porque nos ama, e
porque fomos criados para viver no mesmo amor que existe na trindade divina.
É à paz e ao amor que
Cristo nos chama. Aqueles que conquistaram o Seu coração amoroso por toda a
eternidade, assim como foram também conquistados por Ele, na Sua infinita
retidão, amor, justiça e bondade, demonstrados para conosco.
É preciso pois guardar
nossas mentes e corações das densas trevas que obscurecem o entendimento nestes
dias de tanta iniquidade, porque Deus não muda, e por conseguinte também não
mudará jamais o modo e o propósito com que nos salva por meio da nossa união
com Cristo. Como já dissemos, reafirmamos: foi à paz e ao amor que fomos
chamados por Deus (Col 3.15).
“1 Depois lhe disse
Noemi, sua sogra: Minha filha, não te hei de buscar descanso, para que fiques
bem?
2 Ora pois, não é Boaz,
com cujas moças estiveste, de nossa parentela. Eis que esta noite ele vai
joeirar a cevada na eira.
3 Lava-te pois, unge-te,
veste os teus melhores vestidos, e desce à eira; porém não te dês a conhecer ao
homem, até que tenha acabado de comer e beber.
4 E quando ele se deitar,
notarás o lugar em que se deita; então entrarás, descobrir-lhe-ás os pés e te
deitarás, e ele te dirá o que deves fazer.
5 Respondeu-lhe Rute:
Tudo quanto me disseres, farei.
6 Então desceu à eira, e
fez conforme tudo o que sua sogra lhe tinha ordenado.
7 Havendo, pois, Boaz
comido e bebido, e estando já o seu coração alegre, veio deitar-se ao pé de uma
meda; e vindo ela de mansinho, descobriu-lhe os pés, e se deitou.
8 Ora, pela meia-noite, o
homem estremeceu, voltou-se, e viu uma mulher deitada aos seus pés.
9 E perguntou ele: Quem
és tu? Ao que ela respondeu: Sou Rute, tua serva; estende a tua capa sobre a
tua serva, porque tu és o remidor.
10 Então disse ele:
Bendita sejas tu do Senhor, minha filha; mostraste agora mais bondade do que
dantes, visto que após nenhum mancebo foste, quer pobre quer rico.
11 Agora, pois, minha
filha, não temas; tudo quanto disseres te farei, pois toda a cidade do meu povo
sabe que és mulher virtuosa.
12 Ora, é bem verdade que
eu sou remidor, porém há ainda outro mais chegado do que eu.
13 Fica-te aqui esta
noite, e será que pela manhã, se ele cumprir para contigo os deveres de
remidor, que o faça; mas se não os quiser cumprir, então eu o farei tão
certamente como vive o Senhor; deita-te até pela manhã.
14 Ficou, pois, deitada a
seus pés até pela manhã, e levantou-se antes que fosse possível a uma pessoa
reconhecer outra; porquanto ele disse: Não se saiba que uma mulher veio à eira.
15 Disse mais: Traze aqui
a capa com que te cobres, e segura-a. Segurou-a, pois, e ele as mediu seis
medidas de cevada, e lhas pôs no ombro. Então ela foi para a cidade.
16 Quando chegou à sua
sogra, esta lhe perguntou: Como te houveste, minha filha? E ela lhe contou tudo
quanto aquele homem lhe fizera.
17 Disse mais: Estas seis
medidas de cevada ele mas deu, dizendo: Não voltarás vazia para tua sogra.
18 Então disse Noemi:
Espera, minha filha, até que saibas como irá terminar o caso; porque aquele
homem não descansará enquanto não tiver concluído hoje este negócio.”
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