As palavras de Elifaz no quinto capítulo de Jó, que
estaremos comentando, estão cheias de verdade bíblica e de sabedoria, no
entanto, não eram as palavras que deveriam ser usadas para consolarem a Jó
naquela sua terrível aflição.
Ele exaltou a Deus, e as bênçãos de Deus sobre os
justos.
Todavia, como Jó poderia ser consolado, ao ouvir
naquele momento em que estava com sua alma angustiada até a morte, as seguintes
palavras que Elifaz havia dito:
“18 Pois ele faz a ferida, e ele mesmo a liga; ele
fere, e as suas mãos curam.
19 Em seis angústias te livrará, e em sete o mal não
te tocará.
20 Na fome te livrará da morte, e na guerra do poder
da espada.
21 Do açoite da língua estarás abrigado, e não
temerás a assolação, quando chegar.
22 Da assolação e da fome te rirás, e dos animais da
terra não terás medo.
23 Pois até com as pedras do campo terás a tua
aliança, e as feras do campo estarão em paz contigo.
24 Saberás que a tua tenda está em paz; visitarás o
teu rebanho, e nada te faltará.
25 Também saberás que se multiplicará a tua
descendência e a tua posteridade como a erva da terra.
26 Em boa velhice irás à sepultura, como se recolhe
o feixe de trigo a seu tempo.
27 Eis que isso já o havemos inquirido, e assim o é;
ouve-o, e conhece-o para teu bem.” (v. 18 a 27)
Tudo isto era exatamente o oposto de tudo o que Jó
estava experimentando naquela hora da aflição.
Isto sequer lhe foi dito, como algo em que deveria
colocar a sua esperança para o futuro, mas como uma verdade final e absoluta no
caso dos justos.
Então, em vez de consolo, havia nestas palavras
condenação e acusação, porque atestavam que tudo isto lhe fora arrancado, e por
conseguinte deveria aceitar o fato de que Deus estava grandemente desagrado com
ele.
Mais uma vez, ao tentar justificar Deus, Elifaz
condenou Jó.
Os pastores devem ter muito cuidado para não agirem
como Elifaz em seus ministérios, tirando qualquer esperança de consolo e
salvação para os pecadores, pela apresentação de uma teologia em que não exista
um Deus misericordioso e longânimo, mas somente justo e juiz, que não pode de
modo algum se mostrar favorável para com pecadores perdidos, e nem mesmo para
com os cristãos que estiverem em pecado.
Deus é juiz, é disciplinador, tudo isto é correto, mas
não se apressa para executar a sentença e a disciplina, porque nos dá tempo
pela Sua grande longanimidade para que nos arrependamos.
Assim, se nem mesmo no caso de pecadores declarados,
pode-se aplicar a teologia da instantânea retribuição de Deus ao mal, quanto
mais, a cristãos, que como Jó, sofrem por amor a Cristo e à justiça do
evangelho.
Muitos chamam o livro de Jó de lenda, porque não
admitem que tenha sido real a sua história, porque segundo eles, não há ninguém
que tenha sofrido tanto neste mundo como ele.
De fato, eles não conhecem a história da Igreja, e o
testemunho dos mártires.
Lembro-me neste momento de John Owen, que perdeu
onze filhos, sendo dez deles em tenra idade, ainda quando crianças, e o décimo
primeiro mal ultrapassou a puberdade.
E ele foi afligido de variados e muitos modos, e no
entanto foi um gigante espiritual em seus dias.
Por isso Tiago nos chama a olhar para o exemplo de
Jó, quando somos perseguidos e afligidos por causa do nosso testemunho do
evangelho, tal como estava ocorrendo com os cristãos de seus dias que estavam
sendo perseguidos e mortos, espoliados de seus bens, por causa do testemunho
que davam de Cristo.
A experiência de Jó está narrada na Bíblia para o
propósito mesmo de nos lembrar que Satanás perseguirá todos os santos fiéis de
Deus neste mundo, e que ele os afligirá de um modo ou de outro, e que eles, tal
como Jó, devem permanecer firmes em sua fé em Deus.
Lembro-me de ter aconselhado uma serva do Senhor que
estava muito aflita porque era casada com um homem que não é cristão e que
sempre se gloriava contra ela dizendo que ele apesar de não ser cristão tinha
uma vida não atribulada, e que ela, sendo cristã, estava cheia de aflições e
tribulações.
E o argumento final do diabo através dele para ela
era o seguinte, conforme costuma ser o de sempre: “Onde estava o Deus dela?”
“Onde estava o Seu poder e amor por ela para livrá-la, e dar-lhe uma vida sem
problemas tal como a dele?”.
Isto pode soar verdadeiro, mas como ela sofria por
amor à justiça de Cristo, por se manter firme no seu testemunho de cristã fiel,
quem estava de fato em grande perigo e debaixo de grande desagrado e ira de
Deus era ele, e não ela.
Caso ele não venha a se arrepender de seus pecados e
se converter a Cristo lhe aguarda um terrível inferno de fogo no qual passará
toda a eternidade, enquanto sua esposa, uma vez vencidas as leves e momentâneas
tribulações que temos neste mundo, será achada no paraíso, ao lado de Cristo,
para um viver glorioso pelos séculos dos séculos sem fim.
Elifaz reconhecia que todo homem é atribulado neste
mundo, mas não sabia que Deus somente corrige aos Seus filhos, porque os ama.
A telogia de Elifaz, afirmava o oposto a esta
verdade, porque segundo ele, somente os ímpios são corrigidos, e não aqueles
que confiam em Deus.
Ele considerou de modo simplista que Jó deveria
fazer como ele, que em suas tribulações buscava socorro em Deus para ser
livrado delas; porque estava convicto de que Ele põe num lugar alto os
abatidos; e os que choram são exaltados à segurança (v. 11).
Mais uma vez, havia verdade nas palavras de Elifaz,
mas isto não é uma regra absoluta, porque Deus, em Sua soberania, permite que
os justos sofram neste mundo injustamente, porque Lhe é coisa agradável vê-los
triunfar sobre o mal com a prática do bem, e sendo pacientes em suas
tribulações, até que sejam revestidos de graça e poder pelo Espírito Santo,
para suportá-las.
O apóstolo Pedro admitiu que somos contristados por
várias tribulações, se necessário for, para o aperfeiçoamento da nossa fé. Então
temos tristezas misturadas à nossa alegria, em nossa jornada terrena, rumo à
Canaã celestial.
Podemos dizer que o cristão é alguém alegre com as
tristezas que o acompanham neste mundo. Isto é uma realidade que não se pode
negar, porque Deus mesmo impõe tais tristezas para vários propósitos úteis:
para gerar contrição, arrependimento, fortalecimento de fé etc.
Não se pode portanto afirmar que alguém deve se
converter a Cristo para escapar de todo e qualquer tipo de sofrimento, porque
isto não é verdade, e o próprio Cristo nos chama a carregarmos com paciência e
voluntariamente a nossa própria cruz, e que devemos participar em alguma medida
do mesmo cálice de sofrimentos que Ele teve que experimentar por amor a
nós.
Não devemos buscar tribulações e sofrimentos, mas
não devemos estranhá-los, se Deus, em Sua providência, enviá-los a nós para
sermos provados, tal como havia feito com Jó no passado.
“1 Chama agora; há alguém que te responda; E a qual
dentre os entes santos te dirigirás?
2 Pois a dor destrói o louco, e a inveja mata o
tolo.
3 Bem vi eu o louco lançar raízes; mas logo
amaldiçoei a sua habitação:
4 Seus filhos estão longe da segurança, e são
pisados nas portas, e não há quem os livre.
5 A sua messe é devorada pelo faminto, que até
dentre os espinhos a tira; e o laço abre as fauces para a fazenda deles.
6 Porque a aflição não procede do pó, nem a
tribulação brota da terra;
7 mas o homem nasce para a tribulação, como as
faíscas voam para cima.
8 Mas quanto a mim eu buscaria a Deus, e a Deus entregaria
a minha causa;
9 o qual faz coisas grandes e inescrutáveis,
maravilhas sem número.
10 Ele derrama a chuva sobre a terra, e envia águas
sobre os campos.
11 Ele põe num lugar alto os abatidos; e os que
choram são exaltados à segurança.
12 Ele frustra as maquinações dos astutos, de modo
que as suas mãos não possam levar coisa alguma a efeito.
13 Ele apanha os sábios na sua própria astúcia, e o
conselho dos perversos se precipita.
14 Eles de dia encontram as trevas, e ao meio-dia
andam às apalpadelas, como de noite.
15 Mas Deus livra o necessitado da espada da boca
deles, e da mão do poderoso.
16 Assim há esperança para o pobre; e a iniquidade
tapa a boca.
17 Eis que bem-aventurado é o homem a quem Deus
corrige; não desprezes, pois, a correção do Todo-Poderoso.
18 Pois ele faz a ferida, e ele mesmo a liga; ele
fere, e as suas mãos curam.
19 Em seis angústias te livrará, e em sete o mal não
te tocará.
20 Na fome te livrará da morte, e na guerra do poder
da espada.
21 Do açoite da língua estarás abrigado, e não
temerás a assolação, quando chegar.
22 Da assolação e da fome te rirás, e dos animais da
terra não terás medo.
23 Pois até com as pedras do campo terás a tua
aliança, e as feras do campo estarão em paz contigo.
24 Saberás que a tua tenda está em paz; visitarás o
teu rebanho, e nada te faltará.
25 Também saberás que se multiplicará a tua
descendência e a tua posteridade como a erva da terra.
26 Em boa velhice irás à sepultura, como se recolhe
o feixe de trigo a seu tempo.
27 Eis que isso já o havemos inquirido, e assim o é;
ouve-o, e conhece-o para teu bem.”
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