Nós vemos no início do 14º capítulo de Juízes, que
Sansão estava debaixo da orientação extraordinária da Providência, pois se
afirma no verso 4 que o desejo dele de se casar com uma mulher filisteia era
procedente da parte do Senhor, o qual estava buscado uma ocasião para incitar
Sansão contra os filisteus: “Mas seu pai e sua mãe não sabiam que isto vinha do
Senhor, que buscava ocasião contra os filisteus; porquanto naquele tempo os
filisteus dominavam sobre Israel.”.
Os pais de Sansão argumentaram com ele contra
aquele casamento que contrariava o que estava prescrito na Lei de Moisés, mas
não foi achado pecado em Sansão aos olhos de Deus em relação a isto porque
aquilo, naquela situação excepcional estava provindo do próprio Senhor, e
Sansão estava projetado para agir não debaixo de regras fixas, mas sob a
completa direção de Deus, para cumprir os propósitos que havia fixado em
relação a ele.
Tal como Davi foi citado por Jesus, que tendo
comido dos pães da proposição do tabernáculo, que segundo a Lei deveriam ser
consumidos exclusivamente pelos sacerdotes, e
no entanto não foi achado pecado em Davi
e seus homens, porque não o fizera por motivo de sacrilégio, mas por
estar a serviço de Deus, e necessitavam saciar sua fome, e não havia à mão
outro alimento, senão aquele.
Em tudo isto, tanto Sansão, quanto Davi, são tipo
de Jesus em Seu elevado ministério, que tendo cumprido toda a Lei, estava não
obstante, pela vontade do Pai, acima da própria Lei, e modificou a forma de
aplicação de alguns dos seus preceitos para ajustá-la à Nova Aliança, que Ele próprio inauguraria
com a Sua morte e ressurreição. Somente Ele poderia dizer em relação à Lei,
quando a modificou nestes aspectos em que deveria ser mudada: “Ouvistes o que
foi dito aos antigos, eu porém vos digo...”. Aos antigos é uma referência aos
que estavam debaixo do Antigo Pacto ou Antiga Aliança, mas aos que estariam a
partir dali, debaixo de uma Nova Aliança, Jesus disse coisas que alteravam o
modo de procedimento quanto a determinadas coisas que eram ordenadas na Lei de
Moisés, como por exemplo a questão do olho por olho que foi substituída pelo
amor aos inimigos, e à não retaliação, em qualquer caso considerado.
E assim, Sansão era um enigma, um homem que fez o
que era realmente grande e bom, através do que era aparentemente fraco e mau,
porque ele foi projetado por Deus, não para ser um padrão a nós, mas para ser
um tipo dAquele que sozinho, com a força do Seu próprio braço, opera a salvação
do seu povo; dAquele que não conheceu nenhum pecado, e que foi feito pecado por
nós, e que se manifestou na semelhança
de carne pecadora para que pudesse destruir o pecado (Rm 8.3).
Tal
como no caso de Oseias, que foi levado por Deus a amar e a se casar com uma
mulher adúltera, dada a prostituições, para revelar o Seu próprio amor por um
povo, com o qual estava aliançado, e que era também adúltero e dado a se
prostituir com falsos deuses, também procedeu do Senhor a afeição que ele
sentiu por uma adoradora de Dagom, não para demonstrar, neste caso, o amor que
Ele tinha pelos filisteus, mas para incitar o juízo que havia determinado sobre
eles, em razão do pecado de estarem oprimindo duramente a Israel.
Sansão teria que se infiltrar entre os inimigos de
Israel para que se achasse motivo para a destruição deles, e foi este o motivo
de ter sido movido a desejar se casar com uma filisteia. Quanto a esta
infiltração, Sansão foi também um tipo de Cristo, porque ele necessitou se infiltrar neste mundo,
entre os inimigos de Deus, para trazer salvação ao Seu povo escolhido.
Sansão foi capacitado para a obra de destruição que
teria que realizar, recebendo de Deus uma força física maravilhosa e
extraordinária, e para que tivesse consciência disso, foi permitido que um leão
viesse sobre ele, e se afirma que tendo o Espírito do Senhor se apossado de
Sansão, este foi capaz de despedaçar o leão com suas próprias mãos, como se
fosse um cabrito (v 6).
Deus fez com que Sansão conhecesse a força que Ele
podia lhe dar, de maneira a não temer a nenhuma das dificuldades que teria que
enfrentar, por maiores que elas fossem. Do mesmo modo os cristãos na Nova
Aliança devem se fortificar na graça que está em Jesus Cristo, porque é assim
que poderão vencer todas as dificuldades e aflições deste mundo, por maiores
que elas sejam.
Não seria necessário para que Sansão fosse incitado
contra os filisteus estando no meio deles, por causa do caráter dos que vivem
na prática da impiedade e não têm o temor de um Deus santo e justo que exige
que caminhemos de modo correto na Sua presença.
Tendo as solenidades do casamento durado sete dias
(v. 10) seguindo o costume dos filisteus, não faltaria oportunidade para que se
achasse alguma controvérsia entre ele e aqueles que tinham sido convidados para
a festa.
Possivelmente, era comum, para não serem vencidos
pelo enfado, a prática de jogos e de propostas de resoluções de enigmas. E
Sansão propôs aos filisteus um enigma relativo à colmeia de abelhas que havia
produzido mel na carcaça do leão que ele havia matado, com as palavras que
lemos no verso 14: “Do que come saiu comida, e do forte saiu doçura.”. E eles
teriam o prazo de sete dias relativo às bodas para decifrá-lo, caso contrário
teriam que dar a Sansão trinta mantos e trinta túnicas. Tendo passado três
dias, e como não conseguiam decifrar, eles constrangeram a mulher de Sansão a
conseguir tirar dele a solução do enigma, porque caso não o fizesse queimariam
a ela e a seu pai.
Pensando poupar a própria vida e a de seu pai, e
confiando mais no poder daqueles homens no que do seu marido, em vez de
declarar o fato ocorrido a Sansão, ela o traiu ao dar a resposta do enigma aos
filisteus. Nós veremos adiante que ela e o seu pai acabaram sendo queimados
pelos filisteus, e a fidelidade conjugal ter-lhe-ia poupado daquele mal, mas isto
seria muito para ser esperado de uma adoradora de Dagom.
Sansão pagou os trinta mantos e túnicas da aposta,
só que com o espólio dos compatriotas daqueles filisteus, pois lhes tirou a
vida para se apoderar de seus mantos e túnicas (v. 19). E o Espírito Santo permitiu que Sansão
fizesse isto, porque se diz que o Espírito do Senhor se apossou dele quando ele
tomou a iniciativa de despojar os filisteus, e isto deu também ocasião para
desvinculá-lo das suas novas relações, com o povo que ele deveria subjugar em
vez de estar aliançado com ele.
Ao mesmo tempo que ele passou a ter aversão dos
filisteus como era do propósito de Deus, para que vingasse as opressões deles
sobre o Seu povo de Israel, Deus também fez com que o ódio dos filisteus fosse
incitado contra Sansão, de modo que ao tentarem matá-lo, Deus teria ocasião de
revelar através dele toda a Sua grande glória e poder, humilhando toda a força
dos filisteus através de um só homem.
E tal foi a ira que se apoderou de Sansão contra a
infidelidade de sua esposa, que ele voltou para a casa dos seus pais, como diz
a Palavra, ardendo em ira.
E, sem consultá-lo, o pai da moça deu-a por mulher
a um dos filisteus que estava presente à festa de casamento de Sansão.
“1 Desceu Sansão a Timnate; e vendo em Timnate uma
mulher das filhas dos filisteus,
2 subiu, e declarou-o a seu pai e a sua mãe,
dizendo: Vi uma mulher em Timnate, das filhas dos filisteus; agora pois,
tomai-ma por mulher.
3 Responderam-lhe, porém, seu pai e sua mãe: Não
há, porventura, mulher entre as filhas de teus irmãos, nem entre todo o nosso
povo, para que tu vás tomar mulher dos filisteus, daqueles incircuncisos?
Disse, porém, Sansão a seu pai: Toma esta para mim, porque ela muito me agrada.
4 Mas seu pai e sua mãe não sabiam que isto vinha do
Senhor, que buscava ocasião contra os filisteus; porquanto naquele tempo os
filisteus dominavam sobre Israel.
5 Desceu, pois, Sansão com seu pai e com sua mãe a
Timnate. E, chegando ele às vinhas de Timnate, um leão novo, rugindo, saiu-lhe
ao encontro.
6 Então o Espírito do Senhor se apossou dele, de
modo que ele, sem ter coisa alguma na mão, despedaçou o leão como se fosse um
cabrito. E não disse nem a seu pai nem a sua mãe o que tinha feito.
7 Depois desceu e falou àquela mulher; e ela muito
lhe agradou.
8 Passado algum tempo, Sansão voltou para
recebê-la; e apartando-se de caminho para ver o cadáver do leão, eis que nele
havia um enxame de abelhas, e mel.
9 E tirando-o nas mãos, foi andando e comendo dele;
chegando aonde estavam seu pai e sua mãe, deu-lhes do mel, e eles comeram;
porém não lhes disse que havia tirado o mel do corpo do leão.
10 Desceu, pois, seu pai à casa da mulher; e Sansão
fez ali um banquete, porque assim os mancebos costumavam fazer.
11 E sucedeu que, quando os habitantes do lugar o
viram, trouxeram trinta companheiros para estarem com ele.
12 Disse-lhes, pois, Sansão: Permiti-me propor-vos
um enigma; se nos sete dias das bodas o decifrardes e mo descobrirdes, eu vos
darei trinta túnicas de linho e trinta mantos;
13 mas se não puderdes decifrar, vós me dareis a
mim as trinta túnicas de linho e os trinta mantos. Ao que lhe responderam eles:
Propõe o teu enigma, para que o ouçamos.
14 Então lhes disse: Do que come saiu comida, e do
forte saiu doçura. E em três dias não puderam decifrar o enigma.
15 Ao quarto dia, pois, disseram à mulher de
Sansão: Persuade teu marido a que declare o enigma, para que não queimemos a
fogo a ti e à casa de teu pai. Acaso nos convidastes para nos despojardes?
16 E a mulher de Sansão chorou diante dele, e disse:
Tão-somente me aborreces, e não me amas; pois propuseste aos filhos do meu povo
um enigma, e não mo declaraste a mim. Respondeu-lhe ele: Eis que nem a meu pai
nem a minha mãe o declarei, e to declararei a ti?
17 Assim ela chorava diante dele os sete dias em
que celebravam as bodas. Sucedeu, pois, que ao sétimo dia lho declarou,
porquanto o importunava; então ela declarou o enigma aos filhos do seu povo.
18 Os homens da cidade, pois, ainda no sétimo dia,
antes de se pôr o sol, disseram a Sansão: Que coisa há mais doce do que o mel?
e que coisa há mais forte do que o leão? Respondeu-lhes ele: Se vós não
tivésseis lavrado com a minha novilha, não teríeis descoberto o meu enigma.
19 Então o Espírito do Senhor se apossou dele, de
modo que desceu a Asquelom, matou trinta dos seus homens e, tomando as suas
vestes, deu-as aos que declararam o enigma; e, ardendo em ira, subiu à casa de
seu pai.
20 E a mulher de Sansão foi dada ao seu
companheiro, que lhe servira de paraninfo.” (Jz 14.1-20).
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