Nós vemos no 35º capítulo de Jó, que ao indagar a Jó
se ele tinha direito de dizer que a sua justiça era maior do que a de Deus (v.
2) Eliú não estava insinuando que Jó havia declarado isto diretamente em
palavras, mas que era isto o que se deduzia do modo como ele estava
falando.
Ao dizer que Jó havia afirmado:
“Porque dizes: Que me aproveita? Que proveito tenho
mais do que se eu tivera pecado?” (v. 3)
Na verdade, Eliú queria expressar os pensamentos e
sentimentos de Jó em relação a Deus, por julgar que estava sendo recompensado
menos do que merecia por seus serviços prestados ao Senhor, e que estava sendo
castigado mais do que merecia.
Tais sentimentos e pensamentos são perigosos porque
podem fazer com que sintamos que Deus é mais devedor a nós, do que nós a Deus.
Eliú fez ver a Jó que por maiores que sejam nossas
obras para Deus, não podemos enriquecer a Deus em nada com elas. Ele é auto
suficiente em si mesmo. Diferentemente de nós não pode ser prejudicado pelos
pecados que praticamos, como não pode ser melhorado ou aperfeiçoado com a
prática das nossas boas obras.
De modo que Deus não é devedor ao homem em coisa
alguma.
Ao contrário, o homem que é devedor e dependente
dEle em tudo.
Então não seria o argumento persistente de Jó em defesa da sua própria justiça, que
poderia lhe valer diante de Deus, uma vez que Deus não é dependente dela.
Ser justo é o dever de todo homem, porque foi criado
para ser justo. Se o homem não é justo, ele se desvia do propósito de Deus em
sua criação e por isso se torna sujeito ao Seu juízo de condenação.
Todavia, o homem não pode ser justo se isto não lhe
for concedido pela graça de Deus.
Portanto, como Deus não é dependente de nenhum
benefício dos homens, então não lhes é devedor de coisa alguma.
Se lhes faz o bem é por pura bondade e misericórdia,
e não por qualquer pagamento que lhes seja devido.
É por desconhecer isto que muitos pensam
erroneamente que se fazem dignos e merecedores, eles próprios, da salvação
eterna.
Por isso creem que é possível perder a salvação,
porque julgam que esta se trata de um pagamento de Deus por nossas boas obras.
Quão enganados estão os que pensam desta forma, tal
como Jó estava enganado que Deus era obrigado a livrá-lo por causa de toda a justiça
que havia praticado.
Eliú disse que havia muitos clamores por socorro por
causa da multidão das opressões do braço dos poderosos.
No entanto, ele pondera em seu argumento, que nenhum
destes indaga por Deus que inspira canções e que ensina aos homens mais do que
aos animais da terra, e que pode torná-los mais sábios do que as aves do
céu.
Eles clamam mas não são ouvidos pelo Senhor, porque
Ele não ouve o grito da vaidade, e não lhes responde porque são maus e
arrogantes.
Deste
modo, como Jó poderia ser ouvido enquanto dizia que Deus não se importava com
ele? Então Eliú lhe exortou a esperar no Senhor porque a sua causa estava
perante Ele.
Todavia, como Deus não manifestava a Sua ira
prontamente por causa da Sua longanimidade, e também por não considerar
grandemente a arrogância de Jó, por isso ele, segundo Eliú, se sentia
encorajado a abrir a sua boca e multiplicar palavras sem conhecimento.
Mais uma vez voltamos a dizer que as palavras
proferidas por Jó foram movidas pela amargura da sua alma grandemente sofrida.
E não se pode fazer um julgamento final em cima de tais palavras pronunciadas
em tais condições, conforme Eliú estava fazendo. Mas, como suas palavras eram
condizentes com a sã doutrina, ou seja, com a verdade, Jó as suportou, e o
Senhor não as tomou em conta para juízo.
Podemos dizer que o diagnóstico estava correto, mas
a aplicação do remédio foi exagerada.
“1 Disse mais Eliú:
2 Tens por direito dizeres: Maior é a minha justiça
do que a de Deus?
3 Porque dizes: Que me aproveita? Que proveito tenho
mais do que se eu tivera pecado?
4 Eu te darei respostas, a ti e aos teus amigos
contigo.
5 Atenta para os céus, e vê; e contempla o
firmamento que é mais alto do que tu.
6 Se pecares, que efetuarás contra ele? Se as tuas
transgressões se multiplicarem, que lhe farás com isso?
7 Se fores justo, que lhe darás, ou que receberá ele
da tua mão?
8 A tua impiedade poderia fazer mal a outro tal como
tu; e a tua justiça poderia aproveitar a um filho do homem.
9 Por causa da multidão das opressões os homens
clamam; clamam por socorro por causa do braço dos poderosos.
10 Mas ninguém diz: Onde está Deus meu Criador, que
inspira canções durante a noite;
11 que nos ensina mais do que aos animais da terra,
e nos faz mais sábios do que as aves do céu?
12 Ali clamam, porém ele não responde, por causa da
arrogância dos maus.
13 Certo é que Deus não ouve o grito da vaidade, nem
para ela atentará o Todo-Poderoso.
14 Quanto menos quando tu dizes que não o vês. A
causa está perante ele; por isso espera nele.
15 Mas agora, porque a sua ira ainda não se exerce,
nem grandemente considera ele a arrogância,
16 por isso abre Jó em vão a sua boca, e sem
conhecimento multiplica palavras.” (Jó
35)
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